18 de setembro, 2006

 
Terminou ao final da manhã de 8 de Setembro, o V Simpósio do Clero de Portugal, que congregou em oração e reflexão, no Santuário de Fátima, durante quatro dias, mais de quatrocentos sacerdotes vindos de todo o país.
A Eucaristia de encerramento teve lugar na Capelinha das Aparições, pelas 12h30, sob a presidência de D. Jorge Ortiga, Arcebispo de Braga e Presidente da Conferência Episcopal Portuguesa.
De seguida, apresentam-se as palavras de D. Jorge Ortiga, proferidas na homilia, e, após estas, as conclusões do V Simpósio do Clero:
Homilia de D. Jorge Ortiga, na Missa de Encerramento do V Simpósio do Clero de Portugal:
O presbitério luz eloquente de Cristo
 
Com este Simpósio quisemos fazer uma experiência de comunhão. Ouvimos interpelações, partilhamos experiências, convivemos fraternalmente e, quem sabe, intuímos propósitos de renovação pessoal e comunitária.
Terminar pode significar encerrar ou partir para nova aventura.
Não ouso apontar itinerários. Quero sublinhar orientações propostas pela Liturgia da Palavra.
1- "De ti sairá aquele que há-de reinar sobre Israel" (Miq. 5,1).
Miqueias referia-se a um território. Hoje sabemos que Deus está com as pessoas e quer servir-se das pessoas concretas. Como padres, estivemos para reconhecer que é do amor concreto – vivido entre nós sacerdotes da mesma diocese que emergirá quem tem poder para salvar. O presbitério é o terreno, a ser fertilizado pelo amor – talvez sacrificado e exigente – dos sacerdotes, onde Cristo aparecerá com a eloquência que arrasta. Outrora os Santos arrastaram multidões e deram respostas adequadas em tempos de crise.
Hoje é o Santo – Jesus Ressuscitado – que tocará o coração daqueles que parecem insensíveis aos valores, à moral e à mensagem de Cristo.
Que poderei fazer para que Cristo seja uma presença actuante no quotidiano da minha diocese?
2 - "Ele se levantará para apascentar o seu rebanho pelo poder do Senhor" (Mq. 5,3).
O amor vivenciado entre nós, fará com que Ele se levante – se torne visível – ¬para ser Ele a apascentar pelo poder do Senhor. Somos Ministros, Servos. O pastor é Ele e o nosso sacerdócio compreende-se e tem razão de ser, se age "in persona Christi", ou seja, realizado nas pegadas do sacrifício redentor e acolhedor dos dramas humanos para – qual alquimia divina – os transformar em serenidade e calma. Qual esponja que recolhe a água, nós acolhemos as perplexidades para as levar à intimidade dum encontro orante e permitir que, pela fusão das nossas vidas, Ele continue a orientar e dirigir. Só assim a humanidade se levantará. Ele levanta e ela com Ele encontra a coragem para um encontro com o essencial.
Que poderei realizar para que os sacerdotes e a humanidade se "levantem" deste clima de pessimismo e desânimo?
3 - "Ele será a paz" (Miq. 5,4).
A paz não é um sentimento vago. Acontece na concórdia e na harmonia das diferenças.
Não será que as comunidades onde operamos em nome de Cristo deveriam transbordar muita mais calma e serenidade? As nossas celebrações que oferecem? Agitação? Pressa? Confusão? Não deveriam ser momentos duma tranquilidade activa capaz de gerar um amor que cura e sara as feridas.
Cristo é a paz. Que damos no acolhimento? Que vale mais a burocracia inerte ou a atenção silenciosa e amiga? Não terei de assumir a necessidade dum projecto quotidiano de maior delicadeza e acolhimento dos outros?
4 - "Ela conceberá e dará a luz um filho, que será chamado Emanuel que quer dizer Deus convosco" (Mt. 1,23).
A centralidade de Cristo, como factor de espiritualidade comunitária, provoca o encontro com Maria. Ela conduz a Cristo e Cristo quis necessitar de Maria.
O nosso sacerdócio comunitário tem necessidade de ser Mariano no desejo de ser Maria que gerou Cristo num momento concreto mas que, pelo amor solícito de Canã, repetido imensas vezes, fez com que muitos se encontrassem com Ele. Quase não tinha palavras. Não se impunha. Só repetia. "Fazei o que Ele vos disser". Assim Cristo se tomou o Emanuel, ou seja, aquele que caminhou com a humanidade pois esteve com ela.
A solicitude materna da Igreja, o rosto feminino de Deus, não terá necessidade de permear o meu ministério? A dimensão contemplativa de Maria que "conservava todas as coisas", não pedirá um estilo mais contemplativo do nosso ministério?
5 - Perspectivar o futuro
Respeito a minha afirmação inicial. Não quero apresentar conclusões ou propósitos. Penso, porém, que a liturgia nos recorda duas atitudes como segredos para viver os desafios da hora actual.
5.1. "Deus concorre em tudo para o bem daqueles que O amam" (Rom. 8, 28)
A realidade parece e é sombria. São muitos os enigmas e as perplexidades.
Só que teremos de apostar numa visão positiva e colocar de lado o pessimismo e o desencanto. Pode parecer que as trevas vencem. O amor de Deus supera tudo. Vivamos, por isso, o nosso sacerdócio com alegria e encanto. Fixemo-nos no essencial. Demos espaço à fé como aventura de quem se deixa conduzir por Deus e aqui estaremos bem. Não na ingenuidade, mas na responsabilidade de quem acredita no valor e na necessidade do nosso ministério.
5.2. "Não temas receber Maria" (Mt. 1-20)
Há momentos em que parece que as dúvidas ultrapassam as certezas.
Permitamos que Maria entre nas nossas casas, não só como objecto duma devoção particular, mas como referência e modelo duma Igreja que, duma maneira silenciosa, está no mundo sem ser do mundo. Com ela estaremos a ser semente duma sociedade mais justa. Pode não parecer ou não se ver. A semente é sempre semente. Os seus ritmos não acontecem como queremos. É a aurora duma Igreja nova, através de Sacerdotes renovados num mundo diferente, que nunca mais voltará a ver como até aos dias de hoje. Estaremos na igualdade como todos os outros. A diferença será a alma que rejuvenesce e sustenta.
Que Maria fique na nossa casa e na casa da Igreja. Com ela ganhemos coragem para ultrapassar a noite do Calvário. Que a Páscoa dum Cristo vivo e ressuscitado seja o nosso projecto de vida.

+ Jorge Ferreira da Costa Ortiga, Arcebispo Primaz e Presidente da C.E.P.
 

V SIMPÓSIO DO CLERO DE PORTUGAL
Comunicado Final

Reuniu em Fátima de 05 a 08 de Setembro de 2006 o V Simpósio do Clero de Portugal, com a presença do Senhor Núncio Apostólico, D. Alfio Rapisarda, do Presidente da Conferência Episcopal, D. Jorge Ortiga e de 30 Bispos. Prosseguindo um itinerário de encontro, de comunhão e de formação de longo prazo que se iniciou em 1993, a Conferência Episcopal através da Comissão Episcopal Vocações e Ministérios organizou este Simpósio no qual participaram 417 sacerdotes, provenientes de todas as Dioceses de Portugal e de muitos Institutos Religiosos. Foram conferencistas D. Rino Fisichella, Bispo Auxiliar de Roma, Enzo Bianchi, Prior da Comunidade Monástica de Bose, Doutor João Duque, Professor da UCP-Braga e D. Manuel Madureira Dias, Bispo Emérito do Algarve e a participação de muitos outros intervenientes nos diversos painéis.
O Simpósio foi vivido num clima de alegria, de partilha, de participação e oração, e teve como tema central o Presbitério em comunhão ao serviço da comunhão eclesial.
A comunhão é uma das correntes mais fecundas da actual reflexão da Igreja com evidentes repercussões no ministério presbiteral, na sua acção e esforço e é simultaneamente assumida numa perspectiva de resposta serena e positiva às tendências pós¬-modernas do individualismo, do isolamento e do egoísmo e, aos perigos permanentes do desânimo, da ansiedade e da solidão.
Com a frontalidade de quem não foge às questões difíceis e não esconde a possibilidade de fazer mais e melhor, este V Simpósio deixa na memória de todos a relação fraterna que aqui se experimentou. E, o estimulo que brota deste encontro no sentido de partilhar as nossas convicções e assegurar os nossos compromissos de Bispos e Presbíteros na construção desta comunhão fraterna, assim como a intensidade da oração aqui vivida e a beleza do momento cultural que nos facultou a Banda da Armada, inspiram e incentivam um clima de unidade e de fraternidade no Clero de Portugal. Aqui se sentiu em múltiplas situações, celebrações e actividades a beleza e a alegria da vida dos presbíteros, o privilégio da sua fidelidade, a graça e a bênção dos que dão a vida pelo Reino mas recebem já cem vezes mais, segundo os critérios e os paradigmas do Evangelho. Em síntese, pode afirmar-se que os presbíteros são homens dados ao povo de Deus para viver a comunhão e construir em Igreja a comunidade.
1. Desafios ao sacerdote e à Igreja no contexto das transformações culturais
A interpretação da nova situação religiosa e cultural em que o sacerdote é chamado a realizar o seu ministério e vocação, caracterizada pelo individualismo pós moderno de um homem dilacerado pela ruptura entre a cultura e a fé e confundido pela mudança de alguns paradigmas de pensamento, desafiou os presentes a viver o contraponto da comunhão, anunciando aos filhos da modernidade a referência central da verdade do homem, Jesus Cristo.
Destacou-se a necessidade de redefinir e reafirmar uma identidade presbiteral eucarística, aquela que resulta da intimidade com Jesus Cristo e da solidariedade com os irmãos.
Foi solicitada uma maior visibilidade pública do presbítero no meio do mundo, onde leve a cabo a missão da profecia e da simpatia por esse mundo.
Urge, ainda, rever a própria pregação para que esta seja significativa e verdadeira proposta de sentido.
Ressaltou-se, também, que muitas das solicitações pastorais dirigidas aos presbíteros resultam da inoperância de muitos intervenientes ou agentes eclesiais com os quais o presbítero deve construir a comunhão eclesial e a corresponsabilidade pastoral.
2. Da Trindade à comunhão e à corresponsabilidade
Reflectiu-se de seguida mais directamente sobre a missão do padre, servidor da comunhão numa comunidade também ela responsável e participativa.
A comunhão eclesial de que o sacerdote participa é construída na relação a partir de Deus, Uno e Trino. Neste quadro foram evocados alguns pólos de relação do presbítero. O conceito de sinodalidade permitiu pensar a Igreja como caminho conjunto onde todos são um só corpo em Cristo. Bispos e Presbíteros reconheceram-se numa comum missão de sinodalidade e de construção de um caminho conjunto. A vida em comunhão comporta sacrifícios, exigência, generosidade, doação, dedicação e paciência. Para os presbíteros convocados e enviados a viver novas formas de comunhão, o empenho passa por viver o amor antes do conhecimento, amar o outro antes de o conhecer. Esta é a forma radical de comunhão com o outro que para cada um é um dom de Deus. Neste contexto foi proposta a constituição de unidades operativas de várias paróquias como formas diversificadas e plurais de superar o individualismo moderno e a tendência isolacionista de alguns sacerdotes, mas também de superar a estreiteza da autarquia paroquial ou presbiteral.
A realidade dos Conselhos Pastorais e Presbiterais pensados como organismos de comunhão e mediadores de corresponsabilidade serão alguns dos muitos espaços de realização e de verificação da própria comunhão eclesial. Estas instâncias devem ser compreendidas não como meros órgãos consultivos mas como verdadeiros e privilegiados espaços de concertação, de corresponsabilidade e de comunhão.
3. Caminhos de comunhão eclesial e futuro do cristianismo
Finalmente, foi aberta a linha de reflexão sobre o Presbítero como homem dado enquanto inserido no caminho do Povo de Deus.
Num clima de aprofundada reflexão e de grande amplitude de horizontes, a comunidade foi pensada como lugar de unidade, de diversidade e de pluralidade a partir do conceito de tri-unidade" para significar esta realidade de um Deus que não é estranho à nossa visão do mundo e da história. Pensar o mistério da tri-unidade" possibilita conhecer Deus e o homem. Assumindo assim este conceito de mistério na sua raiz bíblica de desvelamento e de abertura de sentido e de revelação iniciada, a nossa profissão de fé cristã assenta num Deus que fala e que ama. Esta certeza constitui uma marca radicalmente diferenciadora face ás outras tradições religiosas.
Neste contexto, o lugar do Espírito Santo assume uma importância primordial na teologia cristã e na espiritualidade eclesial.
A problemática da alteridade foi bastante desenvolvida ao longo destes dias e forneceu contexto teológico e espiritual a partir do qual é possível implementar a vida de comunhão.
Este Simpósio alertou ainda para o lugar eclesial do outro enquanto dom e possibilidade de participação no mistério "tri-unitário" do nosso Deus. Pretendeu-se deste modo superar o monolitismo eclésiológico, a uniformidade das decisões apenas justificadas pelo poder e algum tom autoritário porventura ainda subjacente no nosso tempo, nas nossas relações interpessoais.
Recorreu-se finalmente aos dados da antropologia para mostrar o húmus humano da recepção da identidade na alteridade: o rosto e o nome são conhecidos pelo outro e é através dessa dimensão que nós acedemos à identidade de nós mesmos, Estando esta alteridade na base da matriz cristã, aquela foi considerada como fundamental para ajudar a transmitir a fé às novas gerações nesta época de ruptura da memória. A exequibilidade do Evangelho e do projecto do Reino de Jesus será a proposta que dará consistência cultural, crédito e eficácia ao anúncio, à transmissão e ao acolhimento da fé perante um dos riscos do nosso tempo que é a indiferença. O amor obriga hoje a colocar este anúncio da fé não no espaço nem dos ritos nem dos dogmas mas na pura gratuidade do dom. O cristianismo não pode ser diluído na ética, não pode regredir para o restauracionismo nem deixar-se instrumentalizar pelo poder.
Olhando Cristo que dá a Vida, "que nos amou e Se entregou por nós como oferta", e aprendendo com Ele como Bom Pastor, o presbítero é um homem dado ao povo, porque é um homem totalmente entregue a Deus por amor do povo.
O presbítero é um homem único e imprescindível no interior da humanidade, consagrado pela ordenação para servir e dar a vida por amor a favor do povo de Deus e de todo o mundo. Este serviço que é ministério sacerdotal que nos santifica e santifica aqueles a quem servimos, que nos faz felizes e constrói as bem-aventuranças do Reino deve ser realizado como testemunho de amor, de alegria e de paz.
Neste dia em que a Igreja celebra a Natividade de Nossa Senhora e neste Santuário a ela dedicado, colocamos no coração da Mãe a gratidão pelo dom deste Simpósio e confiamos-Lhe a vida e o ministério dos presbíteros de Portugal que mais uma vez aqui se comprometeu a percorrer caminhos de comunhão presbiteral ao serviço da comunhão eclesial.
Fátima, 08 de Setembro de 2006, Festa da Natividade de Nossa Senhora
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Informação de Arquivo:
De 5 a 8 de Setembro,  decorre no Centro Pastoral Paulo VI, no Santuário de Fátima, o V Simpósio do Clero, este ano com o tema “O Presbitério em Comunhão. Ao serviço da comunhão eclesial”.
A Comissão Episcopal para as Vocações e Ministérios, organizadora do Simpósio, pretende que a iniciativa seja um espaço de comunhão, encontro, partilha de experiências e o reflexão sobre a condição sacerdotal.
Desde 1993 que esta iniciativa se repete, de três em três anos, congregando presbíteros de todo o país e com a presença de oradores de toda a Europa.
 Programa
5 de Setembro
11h00 — Abertura
11h30 — «O presbítero no contexto de transformações culturais» (D. Rino Fisichella, Bispo Auxiliar de Roma e Reitor da Universidade Lateranense)
15h00 — «Vaticano II como horizonte da comunhão presbiteral» (D. Rino Fisichella)
17h00 — Painel: «Desafios da cultura contemporânea» (Maria da Graça Franco, Manuela Silva, Cón. Nuno Brás; P. Hermínio Rico)
6 de Setembro
10h00 — «Trindade e comunhão eclesial» (João Duque, Professor da UCP)
11h30 — «Presbitério como comunhão» (Prior Enzo Bianchi, Prior do Mosteiro de Bose)
15h00 — Painel: «A participação e a corresponsabilidade» (P. Mário Rui de Oliveira; Alfredo Teixeira; Maria de Lurdes Figueiral, Cón. António Janela)
7 de Setembro
10h00 — «Comunidade e individualismo contemporâneo» (Enzo Bianchi)
11h30 — «Comunhão eclesial: caminhos plurais» (Enzo Bianchi)
15h00 — Painel: «Caminhos de comunhão plural» (D. Manuel Clemente; P. António Ventura de Sousa Borges; P. Doutor António Manuel Martins)
8 de Setembro
10h00 — «Presbítero: um Homem dado ao Povo de Deus» (D. Manuel Madureira Dias, Bispo Emérito do Algarve)
12h00 — Missa de Encerramento presidida por D. Jorge Ortiga, Presidente da Conferencia Episcopal e Arcebispo de Braga.

 
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07 jul 2024

Missa, na Basílica de Nossa Senhora do Rosário de Fátima

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