25 de abril, 2009


 
Segundo as Crónicas de D. João I e do Condestabre, as tropas portuguesas partiram, num sábado, dia 12 de Agosto de 1385, de junto de Atouguia (Ourém), em direcção a Porto de Mós. “À segunda-feira seguinte [dia 14], que era véspera de Santa Maria de Agosto, El Rei partiu para aquele lugar onde foi a batalha e o condestabre ante ele com a vanguarda, a buscar lugar convenhável onde a batalha fosse”. Na tarde desse dia 14, travou-se a “batalha real”, mais conhecida por “batalha de Aljubarrota”.
 
“Em o outro dia [15] – segundo Fernão Lopes - se foi o Conde em romaria a Santa Maria de Ourém [Seiça] por devoção, e tomou logo posse do lugar de que lhe El Rei já tinha feito mercê e prometido o condado. Desde aí, tornou-se ao arraial e as gentes diziam que ele fora soterrar seu irmão, mas tal coisa não era verdade, que nunca mais apareceu, vivo ou morto”. Segundo a Crónica do Condestabre, foi “ao terceiro dia [que] se foi o conde em romaria a Santa Maria de Ourém, de que El Rei fizera mercê e doação”.
 
Nestas deambulações, D. Nuno Álvares Pereira percorreu os caminhos que ligavam Ourém e Porto de Mós, que lhe foram doadas, naqueles dias. Segundo a tradição, as tropas seguiram por Alvega, Fonte Nova, Fátima de Cima, Lagoa da Carreira, S. Mamede, Carreirancha, Alqueidão da Serra. Segundo outra hipótese, a passagem foi por Atouguia, Moita, S. Mamede, etc. Num ou noutro caso, teve de passar pela actual Cova da Iria.
 
Pouco tempo depois de 1917, essa passagem de D. Nuno em Agosto de 1385, foi logo associada às aparições de Nossa Senhora, na Cova da Iria. De facto, o processo de beatificação de Nuno Álvares, interrompido após a ocupação filipina de Portugal, reactivado nos meados do século XIX, novamente interrompido pela revolução republicana (1910) e por outras circunstâncias, teve o seu epílogo, em Portugal, a 7 de Março de 1914, quando o arcebispo de Mitilene, D. José Alves de Matos, juiz delegado, deu a sentença final sobre o culto imemorial e contínuo prestado a frei Nuno de Santa Maria. Finalmente, “a Congregação dos Ritos, a 15 de Janeiro de 1918, depois de analisar o relatório feito pelo cardeal proponente, Vicente Vanutelli (antigo Núncio Apostólico em Lisboa), reconheceu o culto. O Papa Bento XV, a 23 de Janeiro seguinte, ratificou a sentença, tornando-a pública pelo decreto Clementissimus Deus, e aprovou a missa e o ofício da festa ao Beato Nuno de Santa Maria, para o dia 6 de Novembro”.
 
Numa carta colectiva ao Papa Bento XV, datada de 5 de Fevereiro de 1918, dois meses depois do golpe de Sidónio Pais, iniciado no dia 4 e consumado no dia 8 de Dezembro de 1917, os bispos portugueses manifestavam grande satisfação pelo facto de as novas circunstâncias políticas terem determinado uma mudança súbita, por parte do Estado em relação à Igreja. Essa mudança “ocorreu por ocasião da festividade da Imaculada Conceição da Virgem Santa Maria, que era e é dilecta Padroeira da nossa nação”. Nessa mesma carta, os Bispos manifestaram a sua grande alegria pela aprovação do culto do venerável Nuno Álvares Pereira: “Chegou-nos, há poucos dias, uma notícia que enche de alegria os nossos corações e nos obriga a render, de novo, muitíssimas graças a Vossa Santidade, a saber, que Vossa Santidade ratificou o decreto da Sagrada Congregação dos Ritos, que declarou, por sufrágio unânime legítimo, o culto litúrgico prestado ao venerável Nuno Álvares Pereira, varão notabilíssimo da nossa Pátria”.
 
Contemporaneamente, logo após a extinção da diocese de Leiria, em 1882, houve várias campanhas para a restauração da mesma diocese, em que participou activamente o mesmo arcebispo de Mitilene, natural de Leiria, sobretudo depois de resignar e de ter fixado residência em Leiria (falecido em 9 de Abril de 1917). No mesmo dia em que se iniciou a revolução de Sidónio Pais (4 de Dezembro de 1917), foi decidida em Roma a restauração da diocese. E, a 17 de Janeiro de 1918, era passada a respectiva bula “Quo vehementius” do Papa Bento XV.
 
D. José Alves Correia da Silva, primeiro bispo da diocese restaurada, na sua primeira saudação e exortação pastoral, datada de “14 de Agosto - vigília de Nossa Senhora da Assunção e aniversário da batalha de Aljubarrota – de 1920”, dizia: “Aqui estamos, pois. Vimos pregar-vos a religião dos nossos maiores – a Fé que ardia no peito corajoso do Beato Nuno de Santa Maria, a esperança que alentava os nossos arrojados marinheiros por mares nunca dantes navegados, a Caridade que transformava em rosas as esmolas de Santa Isabel, a qual do seu Paço de Leiria minorava todas as necessidades”. É significativo que ele, no seu brasão, além das peças dos Correias e dos Silvas, mandado gravar a representação da ermida de Nª Sª da Vitória e de S. Jorge, fundada por D. Nuno no sítio da batalha de Aljubarrota.
 
Não é, por isso, de admirar que, nos anos seguintes, o Beato Nuno e as campanhas suscitadas para o incremento do seu culto em Portugal, tenham encontrado eco muito favorável na diocese leiriense e na própria evolução do Santuário de Fátima, que começa a estruturar-se depois de 1921 e principalmente, depois de Maio de 1922.
 
É significativo também que o jornal mensal “Voz da Fátima”, órgão do processo canónico diocesano das aparições, iniciado em Maio de 1922, apresente no cabeçalho do seu primeiro número (13 de Outubro de 1922), do lado esquerdo do título, o desenho da bandeira do Santo Condestável e, do lado direito, a silhueta do mosteiro da Batalha e também uma gravura do Beato Nuno de Santa Maria (B. Nuno Álvares Pereira), com uma grande legenda em que se chama a atenção para o facto de ele ter sido conde de Ourém e de os fenómenos de 1917, na Cova da Iria, que tiveram lugar onde, “segundo a tradição, esteve a orar, nas vésperas da batalha de Aljubarrota”, se terem verificado “na ocasião em que Roma tratava de elevar o Santo Condestável às honras dos altares”.
 
Na sua Pastoral sobre o culto do Beato Nuno de Santa Maria na Diocese de Leiria, de 8 de Setembro de 1924, o Bispo de Leiria escrevia: “Na sequência do nosso dever pastoral, vimos falar-vos do culto que devemos, especialmente nós portugueses e fiéis da diocese de Leiria, prestar ao Beato Nuno de Santa Maria, exemplar das grandes virtudes cristãs, cujo decreto de beatificação foi publicado pelo S. Padre Bento XV, de saudosa memória, a 23 de Janeiro de 1918, isto é, dias depois do decreto da restauração da nossa Diocese que tem a data, como sabeis, de 17 do mesmo mês e ano. Nas outras dioceses do país celebrou-se com maior ou menor esplendor este grande acontecimento. A Diocese de Leiria que acabava de renascer, não pôde como tal, associar-se a este grande triunfo do maior herói português, o que procuraremos fazer este ano”. 
 
E o bispo passa em resenha a acção de Nuno Álvares no que diz respeito à defesa da independência da Pátria, sempre fortalecida com a devoção à Eucaristia e à Virgem Santíssima, nomeadamente: “quis assinalar o lugar onde, durante a batalha, tremulara a bandeira portuguesa, erigindo a capelinha de S. Jorge que, pobre como Portugal, se conserva, através dos séculos, a atestar a fé dos gloriosos combatentes de Aljubarrota”; ainda em comemoração da mesma batalha […], mandou construir, no Condado de Ourém, a igreja de Santa Maria de Seiça”.
 
O Beato Nuno tinha uma particular devoção a Nossa Senhora: “Do afecto, da exímia piedade, diz o decreto da Confirmação de seu culto, com que amava a Santíssima Virgem, são esplêndidos documentos e provas a imagem da mesma Beatíssima Virgem que auspiciosamente trazia pintada nos estandartes militares; seis templos, dos sete por ele erguidos, consagrados à Mãe de Deus, as missas que perpetuamente se deviam celebrar nos altares mores desses templos, e os jejuns rigorosos por Nuno fielmente observados nos sábados do ano e nas vigílias das festas de Maria, ainda quando destinados a combate. Tal é, meus amados Diocesanos, o grande herói nacional e o grande santo cujo culto solene vamos inaugurar na nossa querida diocese. Leiria não pode ficar indiferente a este santo movimento, tanto mais que fazem parte da nossa diocese Aljubarrota e Ourém – Aljubarrota, o seu principal feito militar, e Ourém, o seu domínio preferido”.
 
Também a “Cruzada Nacional Nuno Álvares Pereira”, fundada em Julho de 1918, foi desempenhando a sua actividade, em consonância com os próprios acontecimentos de Fátima e participando nas celebrações promovidas pela própria diocese de Leiria, sobretudo desde 1926 até, pelo menos, 1936, nos diversos locais situados no seu território: Ourém, Fátima, Batalha, S. Jorge, Aljubarrota, Porto de Mós e mesmo Leiria. É assim que esta Cruzada aparece frequentemente nas próprias peregrinações que começam a ser organizadas ao Santuário de Fátima, todos os anos, no mês de Agosto.
 
A peregrinação e romagem de Agosto de 1931 ao Santuário de Fátima atingiu o maior esplendor, pois, nesse ano, se assinalava o quinto centenário da morte de Nuno Álvares e também foram muito significativas as celebrações, no ano de 1960, sexto centenário do seu nascimento, e em 1985, sexto centenário da Batalha de Aljubarrota.
           
Uma interessante tradição, transmitida em diversas versões, desde os anos vinte do século XX, refere que o Santo Condestável, na sua passagem desde Ourém a caminho de Porto de Mós, teria acampado, orado e feito uma profecia, na Cova da Iria, anunciando o milagre de 1917.
 
Esta tradição ou lenda, porém, não aparece documentada, por escrito, senão depois das aparições de Nossa Senhora. Não creio que se possa aceitar a sua veracidade, mesmo tendo em conta a reiterada afirmação de que ela já era referida pelos contemporâneos das aparições como tendo sido recebida dos seus pais e avós.
 
Seja como for, esta associação uniu sempre o agora canonizado S. Nuno de Santa Maria à história do Santuário e à própria mensagem de Fátima. Um sinal dessa associação é a sua estátua na colunata exterior do Santuário.
 
P. Luciano Cristino (SESDI)
 
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