13 de junho, 2020

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São João Paulo II e a Virgem de Fátima

 

No dia 18 de maio de 2020 comemorou-se o centenário do nascimento do Papa S. João Paulo II. A comemoração ocorreu a pouca distância de uma outra recorrência centenária: a entronização, no mês de junho de 1920, da Imagem de Nossa Senhora de Fátima na Capelinha das Aparições. [...] Durante os anos em que fui responsável por preparar e dirigir as celebrações do Papa, tive a possibilidade não só de compreender mas também de partilhar com o Papa a sua espiritualidade mariana, a sua ligação filial com a Mãe do Senhor [...].

A ligação entre S. João Paulo II e a Virgem Maria foi certamente muito intensa e tem como nota caracterizadora o sentido materno-filial: a Mãe do Senhor é também, verdadeiramente, nossa mãe na ordem da graça ou da vida sobrenatural [...].

Esta profunda ligação com a Virgem Maria foi expressa no início do seu pontificado, chamando ao seu brasão, com a letra M, a presença de Maria junto à cruz [...]. A sua confiança em Maria não era episódica mas acompanhava-o em cada dia, desde o nascer do sol até ao seu ocaso, e em cada ato significativo do seu pontificado.

As formas com as quais João Paulo II manifestou a sua piedade constante para com a Virgem são variadas. Antes de tudo, a oração pessoal quotidiana: em várias ocasiões a sua piedade mariana assumia a forma de uma peregrinação, de um jejum de uma súplica particular, de gestos públicos que todos podiam ver, como a coroação de uma Imagem da Virgem, gesto que o Papa realizou centenas de vezes, e de gestos privados que só Deus conhece [...].

Na vida e na pastoral de João Paulo II os santuários marianos constituíram, desde sempre, um “capítulo importante”. É conhecido que nas suas viagens apostólicas o Papa cumpria infalivelmente uma visita ao santuário mais importante do país ou do território visitado. Na encíclica Redemptoris Mater, João Paulo cunhou a expressão “geografia dos santuários” para indicar a sua existência em cada diocese e para assinalar a sua função de símbolos da presença operante da Virgem na vida da Igreja [...].

Em Fátima, João Paulo II sentia-se em casa [...]. A primeira peregrinação do Papa, a 13 de maio de 1982, teve um motivo especial, dado que o sumo pontífice atribuiu à Virgem de Fátima uma particular proteção na ocasião do atentado que sofreu exatamente a 13 de maio de 1981: se uma mão puxou o gatilho da pistola, foi uma outra «mão materna a guiar a trajetória da bala», aquela da Virgem «permitindo ao Papa agonizante parar à porta da morte».

O próprio Papa disse que a sua peregrinação a Fátima, em 1982, se devia à proteção da Virgem: «Venho aqui hoje porque exatamente neste dia do ano passado, na praça de S. Pedro em Roma, verificou-se o atentado à vida do Papa, misteriosamente coincidente com o aniversário da primeira aparição em Fátima, que teve lugar a 13 de Maio de 1917. Estas datas encontraram-se entre si de tal modo que me pareceu reconhecer nelas um particular chamamento em vir aqui. E eis que hoje estou aqui. Vim agradecer à Divina Providência, neste lugar que a Mãe de Deus parece ter particularmente escolhido» (Homilia, Fátima, 13 de maio de 1982).

A Virgem de Fátima, naquela ocasião, foi verdadeiramente para o Papa a Mãe que lhe tinha salvado a vida. Naquela peregrinação, o Papa confirmou também para toda a Igreja a mensagem de Fátima: «Com que coisa se apresenta, hoje, diante da Mãe do Filho de Deus, no seu santuário de Fátima, João Paulo II, sucessor de Pedro… e especial herdeiro do Concílio Vaticano II? Apresenta-se relendo com trepidação aquele chamamento materno à penitência, à conversão: aquele chamamento ardente do coração de Maria que ressoou em Fátima há 65 anos» (Homilia, Fátima, 13 de maio de 1982).

[...] Das duas peregrinações do Papa, nas quais participei (1991 e 2000), as recordações mais vivas são as da segunda viagem. Apraz-me assinalar aqui alguns eventos que ligam ainda mais a piedade mariana de S. João Paulo II a Fátima.

A primeira recordação refere-se ao sábado, 13 de maio de 2000, antes da celebração da Missa. Na sacristia pude assistir a uma parte do encontro entre S. João Paulo II e a Irmã Lúcia. Recordo que a Irmã Lúcia trazia uns óculos com lentes muito grossas. D. Serafim de Sousa Ferreira e Silva, Bispo de Leiria-Fátima, era o intermediário entre o Papa e a Irmã Lúcia. Ele, em voz alta, explicava à Irmã Lúcia as perguntas do Papa. E, quando necessário, explicava ao Papa as respostas dadas pela Irmã. Este encontro é uma das recordações ligadas a Fátima que não posso esquecer.

A segunda recordação forte é o Rito de Beatificação dos dois “Pastorinhos” feito pelo Papa [...].

A terceira recordação forte é constituída pelas palavras que o cardeal Angelo Sodano, Secretário de Estado, proferiu sobre a Terceira Parte do Segredo de Fátima: «Segundo a interpretação dos “Pastorinhos”, interpretação confirmada também recentemente pela Irmã Lúcia, o “Bispo vestido de branco” que reza por todos os fiéis é o Papa. Também Ele caminhando fatigadamente para a cruz entre os cadáveres dos martirizados (bispos, sacerdotes, religiosos, religiosas e numerosos leigos, cai por terra como morto, debaixo dos golpes da arma de fogo)».

[...]

S. João Paulo II não só se deslocou a Fátima para venerar a Virgem Maria, mas Ele quis também que a Imagem de Nossa Senhora de Fátima o visitasse em Roma. Recordo duas visitas da Imagem da Virgem a Roma: a 25 e março de 1984 e a 7 de outubro de 2000 por ocasião do jubileu dos bispos. Exatamente em tais ocasiões, João Paulo II teve a possibilidade de manifestar, de modo particular, o seu amor filial pela Senhora de Fátima. Para o Papa a visita não parecia a de uma Imagem mas antes a visita de uma pessoa viva e querida, para ele familiar, quase uma pessoa que se podia abraçar, beijar, uma pessoa com quem dialogar, a quem pedir desculpa, uma pessoa que caminhava, que se deslocava a diversos locais: «Nossa Senhora de Fátima, de quem somos tão devotos e reconhecidos, também no sentido mais íntimo e pessoal, tu quiseste visitar-nos neste dia tão importante aqui em Roma. Como estamos gratos! Como estamos reconhecidos! Que grande graça nos fizeste com esta tua presença, direi pessoal… Estamos todos gratos, todos os romanos, sobretudo o Bispo de Roma. Estamos tão gratos por esta permanência da Imagem de Fátima aqui no nosso ambiente: primeiramente na capela Paulina do Vaticano, depois na minha capela privada, depois na praça de São Pedro durante a grande celebração [jubileu das famílias], por fim nesta Basílica. Agora, conclui-se nesta Basílica a visita da Senhora de Fátima que irá, para estar presente ainda em Roma, para a Catedral do Bispo de Roma, em São João de Latrão e depois também no santuário do Divino Amor. Desculpa-nos, ó Senhora, desculpa-nos ó Mãe de Jesus, se devemos encontrar-nos nesta Roma, em diversos lugares, em diversos locais. Devemos abrir, queremos abrir a graça da tua presença aos diversos ambientes desta grande cidade e diocese do Papa…Beijo os teus pés, porque quiseste dirigir os teus passos para nós. Seja-me permitido, ó Maria, Nossa Senhora de Fátima, dar na tua presença, ainda, uma Bênção a todos os presentes e a toda a Igreja de Roma» (Invocação de despedida da Imagem da Senhora de Fátima, Basílica Vaticana, domingo 25 de março de 1984).

O amor e o reconhecimento do Papa pela Senhora de Fátima tornaram-se evidentes em algumas expressões cheias de ternura que João Paulo II quis dirigir à Senhora em 1984 e em 1991: «Beijo os teus pés» ; «Quiseste dirigir os teus passos para nós»; «Abraça com amor de Mãe e de Serva do Senhor, este nosso mundo humano»; «Minha Mãe, desde sempre e em particular naquele 13 de Maio de 1981 em que senti ao meu lado a tua presença de socorro»; «Maria abraça com a sua nova maternidade no Espírito, todos e cada um na Igreja»; «Amada Mãe»; «Pela segunda vez estou diante de ti neste santuário para beijar as tuas mãos».

Nas suas manifestações de piedade não havia lugar para o calculismo ou a diplomacia [...]. Sempre me tocou o profundo recolhimento com que Ele, em modo prolongado, rezava diante do Ícone da Virgem: parecia que estivesse em diálogo íntimo com Ela para Lhe confiar os destinos da Igreja e da Humanidade. 

 

 

Piero Marini, Cerimoniário do Papa São João Paulo II*

*Este texto foi editado pela redação do jornal Voz da Fátima

(In Voz da Fátima, Ano 098, N.º 1173, 13 de junho 2020) 

 

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