16 de novembro, 2024
“Precisamos de capacidade de escuta para assimilar as diferenças culturais”Arcebispo de Manaus, D. Leonardo Ulrich Steiner, entrevistado em Fátima durante a peregrinação de 12 e 13 de outubro, a que presidiu, pede oração pela paz e expressa o Sínodo como o caminho contínuo da Igreja.
Qual é a importância da Mensagem de Fátima no mundo em que vivemos? A mensagem de Fátima é uma mensagem de paz, de conversão e de oração. A paz é profundamente necessária no momento atual. Mas para alcançar a paz é necessária a conversão. É preciso uma conversão para a fraternidade, conversão dos ouvidos. Precisamos de capacidade de escuta para assimilar as diferenças culturais, para podermos seguir Jesus, que abre a possibilidade de Paz: paz na relação entre os povos, na sociedade, na família, e paz dentro de cada um de nós. É importante a oração. A oração é o que leva a relações novas, pois possibilita encontros. A oração é a própria fala dos encontros. Se a oração for um momento de encontro, as comunidades são mais capazes de se ouvir e de viver a fraternidade. É pela oração que pedimos a paz. Esta peregrinação de outubro no Santuário de Fátima é uma oportunidade para pedir a paz. Precisamos mesmo de implorar a paz, porque a paz está em perigo.
Como participante no Sínodo sobre a sinodalidade em Roma, o que destaca nesta Assembleia Sinodal de outubro de 2024? Todos se sentem livres para dizer o que pensam e isso é realmente importante. Há liberdade para expressar diferentes entendimentos. Há opiniões diferentes sobre a própria Igreja e são assim mesmo os caminhos da sinodalidade. É por aí que o caminho é feito e há diálogo porque existe escuta. Tenho a esperança de conseguirmos oferecer ao Santo Padre um bom texto, com boas conclusões, para continuarmos o caminho que fazemos desde há três anos.
Como perspetiva a Igreja no futuro com este caminho que se faz no Sínodo? Espero uma Igreja onde todos participem e onde todos se sintam incluídos. Uma Igreja na qual todos sintam que fazem parte, movidos pelo Evangelho e por Jesus. Uma Igreja com Jesus no centro, animada pela força do Espírito Santo, que se deixe inspirar, que se coloque a caminho, que escute os pobres, que acolha a realidade e que queira transformar essa realidade, para que se torne cada vez mais visível para todos a presença de Deus.
Qual o contributo do Sínodo da Amazónia para o Sínodo sobre a sinodalidade? O Sínodo da Amazónia foi longamente preparado. Houve grande participação das comunidades. Muitas dioceses fizeram assembleias, discutiram, elaboraram propostas. Cerca de 100 mil pessoas participaram. Isso é algo extraordinário e mostra um caminho sinodal.
No Sínodo em Roma, como faz para garantir a representação das comunidades da Arquidiocese de Manaus? Eu procuro sublinhar a participação nas questões que à comunidade dizem respeito. Na vida da Arquidiocese de Manaus, as mulheres são muito presentes e ativas porque têm uma excelente liderança. Na nossa caminhada sinodal em Manaus, as mulheres propuseram, para não dizer que exigiram, mais formação pela Arquidiocese. São decisivas na animação e no progresso das comunidades. As mulheres são catequistas, líderes, ministras da palavra, ministras da Eucaristia e revelam bom preparo. As mulheres possibilitam que as nossas comunidades continuem e evoluam e talvez o Sínodo deva ter isso em consideração. Principalmente nas comunidades distantes, que não têm presença da Eucaristia por não terem ministros ordenados, que possam presidir a celebrações eucarísticas. A comunidade precisa de orar e de celebrar a fé. Nessas comunidades os leigos exercem funções muito importantes e, na Arquidiocese de Manaus, esses leigos são especialmente as mulheres.
Quais são os maiores desafios sociais, políticos e eclesiais no território da Arquidiocese de Manaus? Há muita pobreza na periferia da cidade de Manaus. Temos um grande número de pessoas a viver nas ruas que procuramos acolher e acompanhar, com a Cáritas da Arquidiocese. O meio ambiente aflige muito pelo desmatamento muito grande que acontece na própria cidade de Manaus. Destroem a mata para construir pequenas casas, de maneira desordenada. É preocupante a diminuição da população do interior. Dos cerca de 4 milhões de habitantes no estado do Amazonas mais de 2 milhões vivem em Manaus, ou seja, mais de metade da população do estado mora em Manaus. A saúde, que não funciona, é um outro grande desafio. Na educação, pensamos como podemos estar mais presentes.
Que mensagem deixaria à comunidade de brasileiros em Portugal? Aconselharia os brasileiros a procurarem uma boa integração. Nós, brasileiros, ao chegar à casa dos outros, devemos entrar com respeito, com reverência e com vontade de ajudar para, dessa forma, podermos receber o que essa casa nos oferece. Eu diria aos brasileiros que não imponham, mas sim que ofereçam o que trazem aos portugueses. Não é fácil, como não foi fácil para os indígenas do Brasil receber os portugueses. É complexa a adaptação cultural, porque exige abertura, entendimento, acolhimento. Eu próprio o senti ao chegar a Manaus. Vinha de fora, do sul do Brasil, de uma outra realidade, uma outra cultura, ainda que já tenha conhecido outras realidades no mundo inteiro.
A Igreja na Europa existe perante uma sociedade cada vez mais secularizada. Como pode a Igreja estar mais presente na comunidade, como sucede na Amazónia? No sul do Brasil isso também sucede. O filósofo Nietzsche dizia que o deserto avança. Nietzsche dizia isso justamente pela questão da ausência de Deus, quando Deus não está implicado no indivíduo, nas relações, nas ideias. Porém, Deus está sempre presente. Ainda que na cultura atual tentem viver como se Deus não existisse, Deus é sempre presença.
Esta entrevista acontece no dia de Nossa Senhora de Aparecida no Brasil, na véspera de 13 de outubro, dia em que se celebra, em Portugal, a sexta aparição de Nossa Senhora. O que lhe ocorre dizer? É sempre Nossa Senhora. Em Guadalupe, no México, é incrível. Nossa Senhora de Nazaré, em Belém do Pará, no Brasil, é algo extraordinário! É sempre a Mãe de Jesus. E é a nossa Mãe.
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