12 de novembro, 2010
Conferência Episcopal Portuguesa
Nota Pastoral sobre os 50 anos dos Cursos de Cristandade
1. A celebração dos 50 anos dos Cursos de Cristandade, em Portugal, constitui uma ocasião propícia para agradecer a Deus todo o bem espiritual que o Movimento proporcionou e continua a proporcionar a milhares de homens e mulheres, e a renovação operada, por sua acção e influência, nas dioceses e nas paróquias. Poderá dizer-se, com verdade, que, nas últimas décadas, ao lado da programação nacional da catequese paroquial e depois da Acção Católica, o Movimento dos Cursos de Cristandade foi actividade apostólica de grande êxito na Igreja no nosso país. Milhares de homens e mulheres regressaram mais conscientes à prática religiosa; muitos leigos descobriram e abraçaram a sua vocação de cristãos no mundo; inúmeros casais descobriram a dimensão cristã do seu matrimónio e da vida familiar; diversos movimentos apostólicos beneficiaram com a entrada de novos membros, despertos para a fé e para o apostolado; muitos ambientes sociais puderam contar com a presença de cristãos comprometidos na sua evangelização. 2. O Movimento dos Cursos de Cristandade nasceu, como sabemos, em Espanha, em tempos de forte tradicionalismo religioso, em que já se sentia que muitos dos que ainda frequentavam a Igreja tinham caído na rotina, na instalação e na indiferença. D. Juan Hervás, o bispo fundador, apoiado por um grupo de padres que trabalhavam com leigos, e por uma equipa de jovens da Acção Católica por eles formados, entre os quais se destaca Eduardo Bonin, empenharam-se num projecto pastoral ambicioso e com novos contornos apostólicos, expresso numa acção evangelizadora concreta, primeiro em favor dos jovens, depois dos homens adultos e, posteriormente, das mulheres. Depressa se viu o valor e o mérito do novo método apostólico, dele se deu conta e se espalhou por todas as dioceses de Espanha, pela América Latina de língua espanhola e, passados alguns anos, também e em boa hora, por Portugal. Portugal recebeu o Movimento directamente de Espanha, através de sacerdotes e leigos de diversas dioceses, a que muito ficamos devendo. Uma metodologia claramente eclesial, apoiada no testemunho de leigos cristãos, na vida em grupo, num projecto espiritual, sério e fundamentado dos responsáveis, na colaboração específica do padre, no apoio das comunidades cristãs e na dos consagrados, no valor da oração e de actos de penitência voluntária, em comunhão com o sacrifício redentor universal de Jesus Cristo. 3. Passados 50 anos, o mundo mudou e a Igreja enfrenta novos problemas. O laicismo, a indiferença religiosa, o ateísmo militante, a proliferação das seitas, a multiplicação de agentes e meios de influência que activam uma nova cultura contrária ao Evangelho, o clima propício, num mundo plural, às mais diversas opções religiosas, políticas e morais, tudo isto denuncia uma situação que se foi tornando premente e que atinge a todos: cristãos e comunidades, mormente quando se vive uma fé rotineira, pouco esclarecida e apostolicamente anémica. Vimos chamando a atenção, em comunhão com o Papa Bento XVI, para a urgência de uma iniciação ou reiniciação cristã alargada, e para uma catequese de adultos, programada e séria; em suma, para uma nova evangelização de pessoas e meios de vida. Neste contexto e fiéis a este projecto apostólico, não podemos deixar de ter presente os movimentos laicais que, na Igreja, mais se dedicam à evangelização e, entre eles, o Movimento dos Cursos de Cristandade, com o lugar que lhe compete e a experiência evangelizadora de que dão testemunho ao longo de 50 anos, quer das pessoas, quer, através destas, dos ambientes sociais. 4. Num mundo diferente, uma Igreja atenta sente-se comprometida com os apelos urgentes de uma nova evangelização, discernindo os sinais dos novos tempos. “Os tempos que vivemos exigem um novo vigor missionário dos cristãos chamados a formar um laicado maduro, identificado com a Igreja, solidário com a complexa transformação do mundo. Há necessidade de verdadeiras testemunhas de Cristo, sobretudo nos meios humanos onde o silêncio da fé é mais amplo e profundo: políticos, intelectuais, profissionais da comunicação que professam e promovem uma proposta mono-cultural com menosprezo pela dimensão religiosa e contemplativa da vida” (Bento XVI, Discurso aos Bispos em Fátima, 13.05.2010). Este projecto de uma nova evangelização e a sua resposta têm hoje exigências que nos afectam a todos e que não se podem traduzir apenas num voluntarismo generoso. Para além de uma renovação espiritual séria dos cristãos e, muito especialmente, dos agentes pastorais e apostólicos, um novo ardor e novas atitudes e competências são exigidas pelo mundo a evangelizar. Neste sentido, está o conhecimento objectivo e cuidado da realidade, as pessoas e os dinamismos sociais, mais influentes no aparecimento de uma nova cultura que determina os comportamentos morais; o aperfeiçoamento permanente do modo de propor o Evangelho e a fé às pessoas de hoje, jovens e adultos; o maior espírito de comunhão e entreajuda de todos os comprometidos na missão; a ausência de juízos negativos e de condenações das pessoas e dos grupos em campo; a colaboração aberta com todos os que desejam e se comprometem no bem das pessoas e da sociedade; a acção programada em prol do crescimento da fé e da vida cristã, daqueles que vão despertando para Deus ou se interrogam sobre o caminho a seguir. 5. O Movimento dos Cursos de Cristandade deve, neste sentido e em consonância com os objectivos propostos, com o dinamismo destas comemorações jubilares, qualificar os seus dirigentes, o trabalho das Escolas de Responsáveis, a sua estrutura mais importante e decisiva. Sem diminuir em nada a fidelidade ao essencial do método dos Cursos de Cristandade, há que aprender a traduzi-lo numa linguagem mais acessível e testemunhal. É necessário, também, saber ler, de modo novo, as exigências do pré-curso, do curso e do pós-curso. Daí a urgência em reavivar as Escolas e outros meios para que sejam espaço de formação actualizada e geradora de empenho missionário. Nas palavras interpeladoras de Bento XVI, “o apelo corajoso e integral aos princípios é essencial e indispensável; todavia, a mera enunciação da mensagem não chega aos mais fundo do coração da pessoa, não toca a sua liberdade, não muda a vida. Aquilo que fascina é sobretudo o encontro com pessoas crentes que, pela sua fé, atraem para a graça de Cristo dando testemunho d’Ele” (Bento XVI, Discurso aos Bispos em Fátima, 13.05.2010). O Movimento dos Cursos de Cristandade terá de se empenhar sempre mais na colaboração com as estruturas diocesanas e com as paróquias, campo normal da escolha dos cristãos chamados a um curso, bem como da sua inserção eclesial e da sua perseverança. Nada substitui ou dispensa o diálogo com os párocos e as comunidades cristãs para a acção diária e continuada. Também o Movimento pode e deve ajudar as paróquias para que introduzam no seu plano pastoral, se ainda o não fazem, o cuidado dos afastados, dos rotineiros, dos instalados em expressões religiosas pobres e empobrecedoras. É neste contexto que se deve realizar um pré-curso responsável e esperançoso, aspecto a cuidar seriamente, pondo de parte improvisações, precipitações, expressões e métodos desadequados e alheios ao Evangelho, ao Movimento e ao tempo em que vivemos. 6. Conhecemos o espírito cristão e a generosidade apostólica de muitos responsáveis do Movimento dos Cursos de Cristandade. Todos nós lhes estamos agradecidos e continuamos a esperar a sua colaboração, nunca negada e, agora, mais premente, nesta tarefa evangelizadora, em que estamos comummente empenhados numa hora inadiável de renovação pastoral. Ao lado do Movimento dos Cursos de Cristandade e no campo específico da evangelização, outros movimentos e associações laicais e serviços diocesanos surgiram ao longo do tempo e actuam nas nossas dioceses. Desejamos que se veja cada vez mais, entre todos, uma colaboração, organizada e permanente. Por nossa parte, empenhamo-nos, como primeiros responsáveis, para que, na fidelidade ao seu método evangelizador, cada um constitua um serviço reconhecido à missão da Igreja, neste tempo em que vivemos e em que queremos enfrentar os desafios pastorais. 7. Não esquecemos que foi em Fátima, sob a protecção da Mãe de Deus e nossa Mãe, que se realizou, em Portugal, o primeiro curso de cristandade. A Maria confiamos o Movimento e todos quantos nele trabalham, a sua renovação em fidelidade e a sua acção em comunhão eclesial. Fátima, 11 de Novembro de 2010 |