12 de janeiro, 2021
“Fátima não é uma soma de castigos mas de apelos sucessivos à esperança” afirma padre Jorge DuarteSacerdote do Porto é a voz do comentário da Rádio Renascença de maio e outubro em Fátima. Fez o seu batismo na narração radiofónica em maio de 1982, durante a primeira visita de São João Paulo II, e de há 40 anos para cá regressa sempre à Cova da iria.
Fátima “é um convite à procura da verdade, daquilo que é essencial” e que é encontrar “um sentido para a vida”, para que ela seja vivida “com esperança”. O diálogo entre Nossa Senhora e Lúcia, para que nada temesse porque teria sempre o Seu consolo, é a principal chave de leitura do padre Jorge Duarte para falar de Fátima, 40 anos depois de ter iniciado o seu primeiro trabalho como narrador da Rádio Renascença, nas grandes celebrações aniversárias, de maio a outubro de cada ano. Numa conversa desempoeirada, ao jeito de quem fala mais com o coração do que com as palavras, o sacerdote do Porto, que já perdeu a conta aos milhões de peregrinos que o viram e ouviram nas ondas da emissora católica portuguesa, olha para Fátima como quem olha para o mar: “é sempre o mesmo, mas não posso viver sem ele”. O padre Jorge Duarte, sacerdote da diocese do Porto, pároco de Mafamude, em Gaia, natural de Vila do Conde, é o convidado do Podcast #Fátima no Século XXI deste mês de janeiro. Na abertura de um novo ano, fortemente marcado pelo que vai sobrando da pandemia, o sacerdote recorda aos que ainda persistem “no preconceito contra Fátima” que aqui se respira a “mensagem de esperança que a humanidade precisa”. “Fátima não é uma soma de castigos, mas de apelos sucessivos à esperança e que nos leva, de cada vez que caímos ou enfrentamos uma dificuldade, a sabermos estar serenos”, adianta. E, prossegue, “a mensagem fundamental que Nossa Senhora deixa a Lúcia é ‘não temas’. Não se trata de nos dar a chave para a resolução de todos os problemas, para os quais temos de fazer a nossa parte, mas dá-nos a serenidade de não entrarmos em pânico nas dificuldades da vida”, esclarece ao acrescentar a segunda parte do diálogo entre Nossa Senhora e Lúcia: ‘O meu imaculado coração por fim triunfará’. “A esperança é a grande mensagem de Fátima; não é esperar que alguma coisa caia do Céu, mas acreditar que cada gesto, do mais pequenino ao maior, vale a pena para a construção de uma nova humanidade”. “Em Fátima respiramos espiritualidade e humanidade. Se me permite a analogia ao Evangelho: Fátima é fazer a experiência de tocar a orla do manto, ir à procura do essencial e depois fazer a experiência bela de não sermos nós a tocar na orla do manto, mas de termos sido tocados por ele”, afirma numa analogia ao episódio da mulher que quer tocar no manto de Jesus para se curar. Por isso, diz o padre Jorge Duarte, os peregrinos são, “a seguir a Nossa Senhora e aos pastorinhos”, o “verdadeiro e grande milagre de Fátima”. “As multidões que ano após ano, sem esperarem nada de novo, regressam estão e comovem-se com Fátima. As cerimónias são sempre iguais; sabemos minuto a minuto como tudo decorrerá; sabemos os sítios e as pessoas continuam a vir... Habituei-me a olhar para essas multidões vendo em cada peregrino uma história, um gesto que é caminho feito, uma lágrima que é vida. Tudo é espontâneo”. “Não vejo qualquer diferença entre os peregrinos que tinham de dormir nos autocarros ou ao relento ou que demoravam horas a chegar a Fátima e os peregrinos de hoje. As condições podem ter mudado a todos os níveis, desde a mobilidade às condições de acolhimento e de alojamento, mas os rostos, os sorrisos e as lágrimas dos peregrinos mantém-se como há cem anos. E por mais anos que passem os peregrinos serão sempre peregrinos”, afirma. “Naquela esplanada encontra-se o silêncio e a paz” que permitem a “peregrinação mais difícil que é da cabeça para o coração” afirma recordando o que lhe disse um amigo pessoal, dirigente da comunidade Hindu em Portugal. “Muitos dos peregrinos de Fátima nem são cristãos; há muitos que vêm em procura de um sentido de vida, de uma paz interior, de uma reflexão”. “Fátima está-me nas entranhas e imagino que está nas entranhas de muita gente”. E, regressa aos preconceitos. “Ao longo destes anos descobri alguns preconceitos e numa peregrinação posso ver muitas coisas. Posso ver, por exemplo, a passadeira das promessas e só ver isto; posso fixar um rosto sacrificial, penitencial ou ritualista e isso são preconceitos” adianta, lembrando que “só entende Fátima” quem vem de coração “aberto e despojado” e quiser “deixar o coração falar”. “O segredo de calçar os sapatos dos peregrinos é não nos tornarmos protagonistas. Tentarmos ser um peregrino à procura dessa grande peregrinação que passa por dentro de cada um de nós e sem preconceitos”, diz ainda. E o que mudou ao longo de 40 anos, desde 82 até agora? “Muitas coisas mudaram no Santuário de 82 para cá” responde, elegendo o que designa por “o caminho da beleza, que foi uma escolha do Santuário”. “É evidente e claro o diálogo entre o Santuário e a cultura de hoje. Fátima é quase um museu a céu aberto no qual muitos artistas contemporâneos inscreveram o seu nome, deixando aqui obras de arte de valor incalculável do ponto de vista estético, inspiradas pela mensagem” refere o padre Jorge Duarte. “E a Igreja estava a necessitar de saber dialogar com a arte e a cultura do nosso tempo”. “É uma beleza despojada, do novo Altar do Recinto à Basílica da Santíssima Trindade... Nós olhamos para estes locais e vemos a história recente do Santuário e o seu contributo para este diálogo com a cultura”, como foi a renovação litúrgica em Portugal. “Ainda está por fazer essa história, mas os encontros nacionais de Liturgia que decorreram em Fátima, mobilizando milhares de leigos, foram decisivos para a mudança litúrgica em Portugal”. O Podcast #fatimanoseculoXXI pode ser ouvido em www.fatima.pt/podcast e nas plataformas iTunes e Spotify. |