06 de junho, 2019

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Fátima afirma-se como uma “geografia psicológica” a partir de vários territórios , afirma diretor do departamento de Estudos do Santuário

Seminário “Caminho de Peregrinações” aborda a relação entre as expressões da mobilidade, as motivações da peregrinação e a dimensão da fé

 

A “geografia psicológica” de Fátima afirma-se e projeta-se através de várias dimensões e extravasa os limites geográficos da Cova da Iria, afirmou esta quinta-feira o diretor do Departamento de Estudos do Santuário de Fátima, Marco Daniel Duarte, no âmbito de uma conferência proferida no Seminário “Caminho de Peregrinações” que está a decorrer na Sociedade de Geografia, em Lisboa, entre hoje e amanhã, sexta-feira, numa iniciativa conjunta do Santuário, da Cátedra do Camiño de Santiago e das Peregrinacións, da Universidade de Santiago de Compostela, e do Centro de Estudos das Migrações e das Relações Interculturais, da Universidade Aberta.

“É a partir de um contexto territorial de expressões diversas que se forma e se afirma a geografia psicológica de Fátima” disse Marco Daniel Duarte sublinhando que Fátima “tornou-se um território a partir do qual se constroem várias estradas” que extravasam o mundo português.

O responsável percorreu a arquitetura, a economia, a política, a espiritualidade ou as dimensões social, intelectual e simbólica nas quais Fátima se projeta, para destacar a mundialização de Fátima como “altar do mundo”.

A inculturação de Fátima- acontecimento, mensagem e simbolismo- “não se limita à mimetização de Fátima” mas nestes novos lugares a “história de Fátima pode dizer-se noutros registos”, esclareceu lembrando que a história destes protagonistas- videntes e lugar- inspirou novas realidades, desde a criação de uma cidade até à afirmação de um novo discurso sobre a paz.

“Uma boa parte da humanidade acredita que a partir de Fátima se dizem coisas importantes para a Paz no mundo”, disse ainda destacando que “Fátima, a partir da sua mensagem, continua a lutar contra os regimes ateus”.

Para Marco Daniel Duarte um dos exemplos catalisadores de Fátima é a Imagem da Virgem Peregrina, que desde 1947 já completou 16 voltas ao mundo , num total de 645 mil quilómetros andados, levando Fátima ao mundo, com particular destaque para a América Latina onde Fátima está particularmente presente na sua devoção “como ficou expresso na viagem da Virgem Peregrina ao Panamá”, aquando da última edição da Jornada Mundial da Juventude em janeiro deste ano.

As modalidades de peregrinações e as suas motivações diversas, com enfoque na vertente religiosa, especialmente centrada em Fátima, foram o tema em destaque no primeiro dia dos trabalhos do Seminário “Caminho de Peregrinações”, que se insere num esforço do Santuário de levar a discussão em torno de Fátima a outros ambientes.

Para além dos encontros científicos que têm lugar na Cova da Iria, o Santuário, através do seu Departamento de Estudos, tem procurado promover fóruns de reflexão académica noutros lugares do país, nomeadamente em instituições que tenham, para além de prestígio cultural, centralidade geográfica e sejam lidas como lugares de reunião de diferentes saberes académicos.

Além da conferência “Fátima: da difusão do culto à composição de uma Geografia Psicológica” de Marco Daniel Duarte destacaram-se neste primeiro dia, mais 5 conferências, duas delas proferidas por membros co-organizadores deste fórum de reflexão, nomeadamente “Os Santos Também emigram: mobilidade humana e transferência de devoções”, por Domingo Gonzaléz Lopo, da Cátedra do Camiño de Santiago, da Universidade de Santiago de Compostela e “Formas de assumir a devoção religiosa em espaço migratório” por Maria Beatriz Rocha-Trindade, do Centro de Estudos das Migrações e das Relações Interculturais da Universidade Aberta.

Para o investigador galego a mobilidade dos indivíduos “pressupõe igualmente a transferência das crenças e devoções próprias da terra de origem” da mesma maneira que o contacto com novas realidades espirituais “supõe, depois do regresso, a introdução no lugar natal destas novas devoções que, deste modo, se vão difundindo por novos lugares”.

Já a professora catedrática da Universidade Aberta, referiu-se às marcas exteriores de devoção que, “concretizadas através de representações simbólicas que homenageiam uma entidade religiosas, consagram a sua existência”.

“Tanto nos lugares de origem como nos de fixação a intenção que subjaz ao assumir público de uma orientação religiosa em espaço aberto assume em regra o sentido de uma dupla pertença cultural”.

De manhã, três conferências dominaram o debate, procurando analisar a questão da peregrinação de forma transdisciplinar e com recurso a categorias que permitiram enquadrar este fenómeno que acompanha a história da humanidade. E, para além da fé e dos rituais que se têm instituído no âmbito da mobilidade dos povos, existe uma envolvência social diversificada, que faz cair fronteiras físicas mantendo, no entanto, uma identidade cultual, que se manifesta na vivência do fenómeno religioso, que quebra fronteiras físicas e geográficas. Uma vez mais Fátima foi apontada como um exemplo , nomeadamente  no que respeita à veneração a Nossa Senhora de Fátima e à peregrinação ao Santuário, que constituem e constituíram desde há um século a esta parte, o denominador comum da religiosidade dos portugueses.

“Durante a Guerra colonial, a fé acompanhou os militares portugueses” afirmou Graça Alves, uma das oradoras do período da manhã, que analisou os “Caminhos da Fé na Guerra do Ultramar: das palavras e dos símbolos”.

Investigadora do Centro de Estudos de História do Atlântico, Graça Alves lembrou como os militares portugueses deslocados associaram o seu caminho ao serviço da pátria, como então se dizia, recheado de medos e de angústias, a uma esperança renovada pela fé em Nossa Senhora de Fátima a quem `encomendavam´ preces em prol do fim da guerra.

“Fátima revela-se neste período da história como o cais de todas as lágrimas, o lugar de todas as dores, mas também o espaço de todas as esperanças”, afirmou.

Maria da Graça Poças das Neves, do Instituto Politécnico de Leiria, a primeira a usar da palavra, com uma intervenção enquadradora do fenómeno da peregrinação, sistematizou os diferentes tipos de peregrinação, as suas diferentes etapas, os rituais que as definem e ainda os fatores que determinam a sua realização.

A partir da migração galega para Portugal, entre o segundo quartela do século XVIII e a primeira metade do século XIX, motivada por questões económicas e ideológicas, Camilo Fernández Cortizo, da Cátedra Unesco 226 sobre Migracións, da Universidade de Santiago de Compostela sublinhou a importância da mobilidade das populações em função de interesses conjunturais que podem determinar um fluxo migratório mais ou menos acentuado.

O Seminário prossegue esta sexta-feira com um olhar sobre o Turismo Religioso, Itinerários Culturais associados à fé e as expressões plásticas que projetam esta dinâmica das peregrinações.

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