07 de novembro, 2021

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“Estou convencido que a minha vida é um dom de Deus e que eu devo oferecê-la para o bem dos outros” afirma cardeal D. António Marto

Bispo de Leiria-Fátima celebrou bodas de ouro sacerdotais este domingo em Fátima e desafiou os cristãos a serem o “Bom Samaritano da humanidade ferida” oferecendo o perdão e a misericórdia

 

O cardeal D. António Marto, bispo da diocese de Leiria-Fátima, celebrou esta tarde uma missa de acção de graças pelo 50º aniversário da sua ordenação presbiteral , uma ocasião para “renovar o seu o sim ao dom de Deus” e olhar “com esperança” o dom das vocações, mesmo diante das dificuldades do mundo.

“O dom do sacerdócio não é só para a Igreja, mas também para a humanidade, para o mundo inteiro” afirmou o cardeal português na breve mas emocionada palalvra que deixou no final da celebração a todos os participantes, na sua maioria diocesanos, amigos e familiares, que encheram a Basílica da Santíssima Trindade.

“Embora vivendo um momento obscuro, confuso, duro e fatigante de viragem epocal nos inícios deste milénio, por isso mesmo é também um momento entusiasmante e apaixonante de ser padre, se soubermos ser dignos desta hora e dos seus desafios inéditos, com o testemunho corajoso e sob a guia clarividente do nosso querido Papa Francisco, a quem agradeço e retribuo a amizade pessoal e testemunho a comunhão e a obediência eclesial”, disse o prelado que assinala as bodas de ouro sacerdotais no dia em que termina a Semana Nacional dos Seminários.

“Trata-se, antes de mais, de esperança no sacerdócio, apesar das aparências imediatas. É a esperança de que Deus nunca deixará de suscitar no coração da Igreja a vocação ao sacerdócio como dom para o seu povo e para a humanidade” esclareceu ainda. 

“Se o povo de Deus vir em nós esta capacidade de ação de graças, de estar contentes e felizes com o dom recebido, de renovar sempre o nosso empenho de dedicação, o sacerdócio tem certamente um futuro. O mistério de Deus que age no íntimo dos corações, passa também através do testemunho de ação de graças, de louvor, de alegria, de esperança e de renovação dos seus padres”, concluiu depois de ter agradecido “o dom da vocação, o dom do ministério, o dom da perseverança, e da alegria com que sempre o vivi, pelas mil alegrias que me ofereceu ao longo do ministério”.

“Confesso com toda a sinceridade que foram cinquenta anos de vida feliz como presbítero e como bispo, vividos sob o lema servidores da vossa alegria”. Nesta “vivência alegre” do seu ministério, D. António Marto sublinhou “a proteção terna e materna da nossa Boa Mãe do Céu, Nossa Senhora de Fátima, e dos santos Pastorinhos, cujo conforto senti, de modo muito próximo e vivo, em momentos de dificuldade”.

“Obrigado, minha querida Mãe! Obrigado meus queridos amiguitos do Céu!”, disse salientando que 50 anos depois continua a “abraçar o sacerdócio com o calor e o entusiasmo da primeira hora, acrescido pelo conhecimento do mistério de Deus e do homem, que o ministério me ajudou a aprofundar”.

“Estou convencido que a minha vida é um dom de Deus e que eu devo oferecê-la para o bem dos outros”, concluiu visivelmente emocionado.

Homilia desafia cristãos a serem o "Bom Samaritano" de uma humanidade ferida

Na homilia da Missa que concelebrou com uma significativa parte dos presbíteros da diocese de Leiria-Fátima, entre eles o Reitor do Santuário, padre Carlos Cabecinhas, e outros colegas bispos, o cardeal deixou o desafio de um maior diálogo e compreensão entre a Igreja e o mundo de forma a combater uma indiferença generalizada ao evangelho ,que se transforma depois em indiferença em relação aos outros.

“Muitos dos nossos contemporâneos não conhecem mais a mensagem do evangelho. Mesmo o seu vocabulário já não é compreendido” afirmou D. António Marto. 

“Será que voltamos aos primeiros tempos da Igreja em que havia apenas pequenos grupos de cristãos num mundo pagão e indiferente? E hoje um mundo simplesmente ignorante da fé cristã? Que fazer?”, interpelou dando, de imediato, a resposta:”Comecemos por desenvolver em nós uma saudável tomada de consciência da nossa identidade cristã. Sem pretensão nem orgulho. Trata-se muito simplesmente de ser verdadeiro”.

Para o cardeal português, nascido em Chaves, é preciso que os cristãos dialoguem mais com o mundo, assumindo o papel do “Bom Samaritano”.

“Sejamos o Bom Samaritano da humanidade ferida”, disse pedindo, ainda, aos cristãos que continuem a trabalhar pela “fraternidade e amizade social, pela justiça, a solidariedade e a paz, combater a fome e a violência, cuidar e salvar o nosso planeta como casa comum de todos”. 

“Precisamos do dom de falar à nossa época, com firmeza e  compromisso, mas nunca num tom de superioridade e menos ainda de desprezo. Precisamos do dom de falar como Jesus” afirmou prosseguindo: “falar aos nossos contemporâneos para servir e não para dominar, de modo humilde tecendo relações e pontes para unir margens. O estilo de Jesus é de proximidade, compaixão e ternura”.

“Se não formos esta Igreja da proximidade, com atitudes de compaixão e ternura, não seremos a Igreja do Senhor... uma Igreja que não se separa da vida, mas cuida das fragilidades e das pobrezas do nosso tempo, curando as feridas e sanando os corações com o bálsamo de Deus” recordou D. António ao citar as palavras do papa Francisco .

O prelado reconheceu, ainda, que o mundo precisa de reconciliação e perdão.

“O mundo tem necessidade de algo mais da nossa parte: a reconciliação e o perdão. Entre nós e em toda a parte. Reaproximação e reconciliação entre todos de cores, raças e línguas diferentes, mas que vivem juntos. Certamente, na base será sempre preciso o respeito do direito e da justiça. Mas o mundo só será viável e vivível quando sobre o húmus do direito e da justiça florescer a planta medicinal que se chama reconciliação e perdão”, disse.

“Os homens e as mulheres do nosso tempo precisam de tomar consciência de que nem só de algoritmos vive o homem! Vive também da fraternidade e da amizade social, da cultura do encontro e do cuidado recíproco, da reconciliação e da paz dos corações, dons de Deus” afirmou. 

“Como cristãos devemos tomar parte sem reticências na cultura da nossa época: na ciência, nos seus progressos, no fabuloso desenvolvimento das novas tecnologias, na arte, na sensibilidade. Sem dúvida será preciso também o dom do discernimento. Nem tudo o que é proposto no mercado global da nossa cultura tem o mesmo valor. Mas como discernir, se nos pomos à parte?”, afirmou D. António Marto ao destacar que os cristãos devem ser capazes de apresentar o rosto de “deus vivo”, sem medo.

“Os cristãos vivem neste paradoxo: estão no mundo mas não são do mundo. Em certos momentos, isto é crucificante. Como o foi para Jesus: puseram-no na cruz entre o céu e a terra. “Veio ao meio dos seus, mas os seus não o receberam”. Amou o mundo, mas o mundo não o amou. É também a nossa cruz: estar suspensos entre o céu e a terra. Mas é nesta posição de crucificados que trazemos ao mundo uma força de ressurreição”.

“Como seguir alguém se é apenas uma sombra fugidia ou figura histórica dum museu? Mostremo-nos muito simplesmente tal como somos: discípulos de Jesus Cristo vivo e portadores do evangelho. Sem complexos nem arrogância. Sejamos nós mesmos. Isso é permitido e é mesmo obrigatório. (...) Anunciar e praticar o evangelho na sua radicalidade. E sobretudo não fazer dele um segredo”, afirmou.

“Há tantas coisas a olhar nos nossos dias: a crise pandémica, económica e social; a nossa Igreja em plena tempestade no mar deste mundo tão agitado; tantos homens e mulheres a viver em pobreza material e tantos outros no mal estar espiritual; todos os buscadores de felicidade que não a encontram. Pois bem, repito: ponhamos o nosso olhar em Jesus!”, adiantou pedindo que se ame mais a Igreja.

“Sem dúvida, ela traz as sua rugas de dois mil anos de história. É santa e pecadora. Mas é bela, não deixa de trazer em si a beleza do amor de Deus e da fraternidade ente os irmãos.(...) Precisamente por isto compreendemos também que a Igreja tem necessidade de permanente purificação e renovação”.

Ordenado sacerdote em 1971, em Roma, pelo cardeal D. António Ribeiro, D. António Marto é natural de Chaves, diocese de Vila Real, onde nasceu no dia 5 de maio de 1947 

Exerceu o ministério sacerdotal como educador no Seminário do Porto, professor de Teologia e colaborador na atividade pastoral paroquial naquela diocese e foi ordenado bispo em 2001, exerceu o ministério episcopal em Braga e em Viseu.

Nomeado para a Diocese de Leiria-Fátima, iniciou a sua missão nesta Igreja particular, no dia 25 de junho de 2006. Tendo recebido o Papa Francisco na sua peregrinação a Fátima, em maio de 2017, D. António Marto foi por ele criado cardeal em 2018.

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