13 de março, 2020

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E QUEM NÃO TEM UMA MÃE?

 

Tantas pessoas que atravessam a vida sem uma mãe próxima, presente, acolhedora, bondosa, compreensiva, tolerante, capaz de ouvir com o coração. Tanta gente a quem faz falta uma boa mãe. Tantas mulheres e homens que perderam a sua mãe. Tantas crianças que também já não a têm. E tantas mães que não conseguem estar com os seus filhos porque moram longe ou porque eles as levaram para um lar e, depois, deixaram de as visitar porque a vida é difícil e o tempo não chega para tudo.

Mãe é mãe, ouvimos dizer com frequência. Mas o que é que isto quer dizer? Não basta gerar filhos para ser mãe. Qualquer mulher pode ser uma grande mãe sem nunca ter tido filhos seus, basta que ame e cuide, acolha e proteja, que decida adotar de todo o coração quem não gerou, mas a faz sentir e agir como se fosse seu. Muitas crianças e jovens, muitos homens e mulheres foram mais bem tratados pelas mães adotivas, por madrinhas, educadoras e tutoras, do que os que se sentem órfãos de mães e pais vivos.

Nossa Senhora, que é o maior e o melhor exemplo de Mãe que podemos ter, tem sido verdadeira mãe para muitos destes filhos abandonados à sua sorte, mas também dos que realmente a perderam por doença, acidente ou velhice. Lembrei-me de escrever sobre isto porque assisti em Fátima a uma cena que jamais esquecerei

Um homem ainda relativamente novo chegou à Capelinha das Aparições com um rapazinho pela mão. Ajoelharam em silêncio e ali ficaram por uns momentos.

O homem, dobrado sobre si mesmo em atitude de entrega e súplica, fazia as suas orações enquanto o rapazinho permanecia mais vertical, mas de olhos fechados e mãos postas. Os dois eram uma imagem de ternura e dor. Pressentia-se na devoção de cada um uma grande ausência, mas também um enorme consolo.

Confiados à Virgem, ali estavam ao lado um do outro, em oração. O homem parecia mais vergado pela dor, porventura mais consciente da irreversibilidade das grandes perdas por morte. O rapazinho mantinha-se de joelhos, olhos fechados com muita força, cabeça ligeiramente inclinada para baixo e as mãos postas ao nível da testa.

Não sei quanto tempo durou a oração de cada um, mas sei que o seu silêncio impôs mais silêncio na Capelinha, onde o movimento das pessoas que chegam e partem é incessante, como que perpétuo. Todas as pessoas viam o que eu via e todos se foram calando ou falando muito em segredo, por respeito àquele pai e filho.

O rapazinho foi o primeiro a dar sinais de que o seu encontro com Nossa Senhora estava a terminar. O pai não reparou e continuou o seu diálogo, a sua conversa interior. No fim, benzeu-se e procurou instintivamente a mão do filho, que já estava distraído com duas senhoras que acendiam velas para as colocar perto do altar. Deram-se as mãos, mas não disseram uma palavra.

O pai sentou-se nos bancos de madeira comprida, mesmo de frente para Nossa Senhora, e puxou o filho para o colo. Quando o tinha aconchegado nos joelhos e abraçado a toda a volta, disse-lhe:

- Estás a ver a Nossa Senhora?

O rapazinho acenou com a cabeça, que estava toda inclinada sobre o peito do pai, bem encaixada, e esticou os braços para cima e para trás, para o abraçar até ficar como que pendurado no seu pescoço.

- A partir de agora a tua mãe é Nossa Senhora, nunca te esqueças.

Não me lembro do que é que o rapazinho respondeu, nem sei se disse alguma coisa. Vi-o a olhar fixamente a Mãe, muito calado e compenetrado, talvez a tentar perceber o alcance daquilo que o pai lhe tinha acabado de dizer. Ou não, simplesmente a acolher no seu coração o que ouvira.

Ainda estiveram sentados uns bons momentos, ambos ligados pela forma como estavam abraçados, naquela intimidade indizível entre pai e filho. A imagem comoveu todos os que estavam presentes. E lembro-me de ter pensado no instante em que Nossa Senhora recebeu do seu Filho a missão que este pai verbalizou e transmitiu ao seu próprio filho. E rezei a agradeci a Deus por haver no mundo tantas mulheres e homens que, com ou sem mãe na terra, contam com a Mãe do céu.

 

Laurinda Alves, Jornalista, escritora, tradutora e professora universitária de Comunicação, Liderança, e Ética

(In Voz da Fátima, Ano 098, N.º 1170, 13 de março 2020) 

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