06 de junho, 2010

A morte como momento de encontro – Isabel Varanda
Isabel Varanda partiu da experiência da Jacinta como alguém que sabia que iria morrer, que pressentiu a morte. O que afligia Jacinta era morrer sem receber o pão dos anjos.
A reflexão dividiu a sua reflexão em seis pontos.
1 o que significa o dom da mortalidade? O que significa pensar ou não pensar a morte? Neste primeiro exercício de contextualização, apresentou o contexto da teologia e da percepção da vivência da morte. Começou por perguntar se a vida humana tem ou não um sentido de vida eterna? Recordou que a vida não é uma mera etapa de passagem para o além, nem uma transferência do amor para outra vida. Lamentou a deserção da escatologia do horizonte na teologia contemporânea, o que implica reflexão pastoral. Passou então a considerar o lugar da morte e a concepção bíblica da imortalidade. A morte biblicamente não é a morte biológica mas entendida como corte de relação. A imortalidade no sentido bíblico não diz que o homem é imortal mas no modo de a atravessar. Afirmar a imortalidade diz apenas que a morte não mata a vida mas é uma etapa da vida. A morte na fé cristã é a morte na vida e não a morte da vida, significa não acabar na morte. É etapa radicalmente transfiguradora da vida.
2 corpo e alma, dualismo ou dualidade? Recordou que para a mentalidade grega era árdua a ideia da ressurreição. A teologia católica, por influência de Platão e de Agostinho, preferiu sempre a alma ao corpo, inscrevendo algum dualismo na fé. S. Tomás avança outra característica ao afirmar que a alma é a forma do corpo. O corpo é o resultado ao ser informado pela alma. Alma estrutura a matéria, a qual se converte em corpo. Corpo é então matéria encarnada. Corpo e alma para S. Tomás supõe uma distinção metafísica, mas não física. Estabelece assim uma unidade.
3 com a morte biológica, o que morre ou quem morre? Morre o corpo e alma continua? Nesse momento a alma seria separável do corpo. Mas se alma não morre seria insustentável a ressurreição. Então com a morte biológica morre a pessoa toda? Sim e não. Não é a morte total da pessoa, ainda que seja a morte biológica total. Com a morte biológica morre a pessoa toda? Sim. Então, a morte de Cristo não foi uma morte aparente. Na morte dá-se à luz a eternidade.
4 com que corpo ressuscitam os mortos? Não reencontramos a mesma matéria. Se assim fosse, a ressurreição estaria ligada à recuperação do cadáver. Na verdade, materialmente existe mudança na matéria. Isabel Varanda usou a imagem do grão de trigo para mudar esta mudança. Usou esta analogia para evidenciar a continuidade e a descontinuidade radical. O que permanece é o eu.
5 e o lado de lá da morte? À luz da fé, a vida continua. Pela morte quem morre não vai para o outro mundo. Jesus inaugurou o reino não no outro mundo. Então existem apenas outras dimensões do mesmo mundo. Mudamos de lugar mas não mudamos de mundo. Por isso, Deus acompanha-nos na morte. A ressurreição é assim acção total de Deus. Aqui, Isabel Varanda não deixou de evocar o lugar do purgatório como ocasião de purificação. Tal não é possível sem a continuidade entre a identidade terrena e a plenitude da vida. Terei de ter a consciência da minha identidade.
6 e a ressurreição final? Isabel Varanda recusa a categoria do “juíz” para significar a acção de Deus. Depois do Deus juiz do século XVIII e do Deus bonacheirão do século XIX, o século XX descobriu o Deus amor. Mas isto não foi ainda implementado pastoralmente. Isabel Varanda chamou a atenção de que, sem prejuízo na fé e na esperança na ressurreição final, é possível a ressurreição na morte e a escatologia intermédia. E chamou a atenção para as incongruências e confusões da linguagem pastoral e litúrgica na actual celebração das exéquias. Aqui, apresentou a lucidez da fé da Jacinta no céu, que não é um repouso eterno, mas uma alegria activa, como Jacinta dizia: lá iria rezar e pedir muito pelos outros, e contemplar.
Em síntese, Isabel Varanda leu a vida humana com muita acribia, na morte e na vida, à luz de duas categorias: a de analogia e a da antecipação, com as quais as realidades últimas serão aquilo que já agora semeamos. Assim, o céu da fé (Deus) não é um lugar mas um modo de ser, um estado. O inferno é então o ver Deus e não querer completar esse Deus.
Eloy Bueno de la Fuente – compaixão como desafio à Igreja e ao mundo
O conferencista apresentou a compaixão como categoria radical para apresentar e viver a alternativa cristã, alternativa histórica e concreta, como o é a própria categoria radical da compaixão. À luz do Deus compaixão e compassivo, Eloy Bueno apresentou a fé cristã e o Deus Trindade como crítica e ocasião de salvação de muita cultura anti-humanista inspirada no Dionísio de Nietzsche. Neste sentido, a grande tarefa deixada à Igreja, segundo o professor de Burgos, continua a ser a vivência e o testemunho do Deus compaixão, a questão volta a ser a antropologia, a humanização. Assim, Eloy Bueno apresentou uma crítica à globalização precisamente por não ter em conta os sacrificados e por sacrificar a muitos. Neste sentido, só a memória dos crucificados do nosso tempo poderá romper o ciclo de violência de muita globalização, globalização protagonizada por instituições e instâncias anónimas e frias. Daqui, Eloy Bueno apresentou algumas directrizes para a acção da Igreja e para o testemunho da compaixão: a reconstrução de associações de leigos que se dediquem a esta tarefa no seu lugar específico (o mundo); a assunção pelos leigos desta missão nos diversos âmbitos da sociedade; a apresentação de uma visão católica da economia e do pensamento social católico; o esforço de atenção pelos mais necessitados; um olhar samaritano pelo mundo. O conferencista apresentou assim uma visão muito actual e em diálogo com a cultura contemporânea, pondo a pequena Jacinta a voltar a falar com o nosso tempo. E é sintomático que tenha concluído a sua reflexão desafiando a fazer como a Jacinta: a repartir com alegria.
Finalmente, Sua Exa. o sr. D. António Marto, bispo de Leiria-Fátima, apresentou três tarefas que o congresso deixa ao santuário: a memória, a profecia e a companhia. Na primeira integrou a necessidade do anúncio da mensagem de Fátima como lugar da memória do sofrimento do mundo dos homens e dos homens deste mundo. Esta memória constituirá assim uma instância crítica de muita cultura narcótica e anestesiante, de muita cultura narcisista que se esquece do tempo, dos crucificados, da história e do essencial da vida.
No que diz respeito à profecia, assumiu o sentido bíblico – aquela palavra de Deus que vem trazer esperança à história dos homens enchendo a história de sentido, e abrindo a um futuro. Tal acontece por compaixão de Deus para com o seu povo, para com a humanidade. Analogamente, Jacinta e Fátima são palavras proféticas, e a compaixão pelo mundo dos homens constitui a profecia de um futuro, de um mundo outro.
A companhia constitui a tarefa samaritana da Igreja, de se tornar presente em situações de desespero. A companhia aos crucificados do nosso tempo, repartindo com alegria como a Jacinta, constitui uma palavra outra.
 
Carlos Cabecinhas – José Carlos Carvalho
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