16 de agosto, 2024

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Da floresta dos Valinhos ao verde que abraça o Recinto, as árvores são incontornáveis na história de Fátima

Dos Valinhos à Cova da Iria, árvores centenárias, contemporâneas dos Pastorinhos, convivem em harmonia com outras mais recentes. Todas contribuem para manter o cenário de paz e o ambiente de silêncio que caracterizam Fátima. Todas têm uma história para contar.

 

São cerca de 60 hectares de um verde espontâneo onde predominam os carvalhos e as azinheiras. Ocasionalmente avistam-se pinheiros e eucaliptos, mas esses não são autóctones. Em tempos remotos, quem os semeou procurava o sustento que não conseguia obter com as espécies nativas e a agricultura pobre. Na floresta dos Valinhos, a exemplo de toda a Serra de Aire, falta terra e falta água. Em contrapartida, abunda pedra cuja brancura, em contraste com o verde, gera recantos de enorme beleza sobretudo nos meses de primavera e de verão.

Num terreno com estas características, ver uma árvore de grande porte é motivo de espanto. “Este será possivelmente o nosso melhor exemplar”, afirma José Sales, enquanto aponta para um carvalho com cerca de 14 metros de altura, 29 metros de diâmetro de copa e 3,1 metros de perímetro de tronco. É um assombro de árvore. O coordenador do Serviço de Espaços Verdes e Limpeza de Exteriores do Santuário de Fátima destaca o emaranhado de ramos. Estima-se que a árvore já tenha ultrapassado os 100 anos. Este carvalho, a azinheira da Cova da Iria e algumas oliveiras serão os espécimes mais antigos que o Santuário tem a seu cuidado.

A floresta dos Valinhos é povoada por milhões de árvores. Em diferentes estágios de desenvolvimento e de fisionomia muito distinta, combatem em silêncio por água e luz. Sobrevivem as que encontram uma porção de terreno que lhes dê esses dois trunfos. Tudo acontece de forma natural. É a natureza que dita as regras e estas são para respeitar. A mata insere-se em reserva ecológica nacional e está certificada. A gestão vai sendo feita com o mínimo de intervenção possível, sem recurso a herbicidas e sem cortes por entidades que não sejam igualmente certificadas, esclarece José Sales. 

O resultado é um santuário verde, digno de ser contemplado em harmonia com a história do lugar e dos seus três protagonistas. “Estas árvores é que viram os Pastorinhos andar por aqui, têm todas uma história para contar, temos de as respeitar”, refere José Sales para justificar por que razão não corta uma oliveira que definha sob um carvalho. “Pelo tronco, percebe-se que tem muitos, muitos anos”, refere.

 

Oliveiras centenárias

Tal como os carvalhos e as azinheiras, as oliveiras também se revelam resistentes. Por vezes, parecem brotar das pedras e dos locais mais extremos. Constituem a terceira espécie em número e algumas são centenárias. Entre antigas e novas, contam-se cerca de 5500. São elas que dão corpo à vertente agrícola dos Valinhos.

A produção de azeitona não tem conhecido ventos favoráveis. No ano passado, o Santuário entregou na Cooperativa de Olivicultores de Fátima 13 toneladas quando, no passado, chegou a exceder as 30. O azeite destina-se a consumo próprio.

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O maior olival dos Valinhos tem mil árvores. Existem outros com menor número, mas também se veem oliveiras dispersas entre carvalhos e azinheiras. Destas não se pode esperar muito. A concorrência é feroz. José Sales e a sua equipa vão dando uma ajuda, enxertando, “tirando os ladrões” e podando para que consigam rebentar. Mas são muitos os fatores que têm de convergir para que uma árvore cresça e se mantenha. Nem sempre há êxito.

A par deste trabalho, os cinco colaboradores do Santuário encarregados de zelar pelos Valinhos cortam o mato — por norma de dois em dois anos — e mantêm limpas as faixas de gestão de combustível perto de habitações. Da sua responsabilidade são igualmente a limpeza e a manutenção do Caminho dos Pastorinhos onde, entre outros pontos de interesse, se encontra a Loca do Cabeço, local em que se terão dado a primeira e a terceira aparições do Anjo aos Videntes.

 

Parques naturalizados

Resumem-se a três os espaços relvados do Santuário de Fátima. Um situa-se no Centro Pastoral de Paulo VI, outro pode ser visto junto ao parque de estacionamento n.º 2 e o terceiro é o canteiro que envolve o Sagrado Coração de Jesus. A regra, como explica José Sales, é respeitar o que o local permite gerar. Em terreno seco — não porque falte a chuva, mas porque a permeabilidade calcária da serra não retém a água à superfície — a opção recai sobre espaços naturalizados. “A relva é das coisas que a nível de jardins gasta mais água; no sítio onde estamos não faz sentido”, explica.

Nos parques de estacionamento que contornam a Basílica de Nossa Senhora do Rosário o que se encontra são prados de sequeiro, o mais naturalizados possível. Alecrins, rosmaninhos, madressilvas e sargaços compõem a generalidade dos canteiros.

Em comparação com os Valinhos, nos parques do Santuário existe maior diversidade de árvores. O objetivo é, sobretudo, fazer sombra, uma vez que são procurados com regularidade para piqueniques e encontros familiares, com particular intensidade nas grandes peregrinações entre maio e outubro.

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Árvores autóctones coabitam com espécies exóticas. A grevília australiana, a casuarina asiática, a tipuana sul-americana e o ácer canadiano vivem em harmonia com o pinheiro manso e o sobreiro ou com o carvalho e a azinheira tão típicos da região. Fazem, assim, jus ao espírito de Fátima enquanto lugar de encontro e de sã convivência entre fiéis independentemente da origem.

Os parques de estacionamento a poente — vulgarmente designados de norte — são os mais antigos e arborizados. Os de nascente, mais recentes, assistem e aguardam pelo crescimento das suas árvores. Vai levar tempo até que os exemplares deste lado ombreiem com os da vertente oposta.

O buxo compõe uma parte significativa das sebes do Santuário porque se adapta bem. Mas por ali também se encontram medronheiros, viburnos e phillyreas. Na primavera, cruzamo-nos ainda com a flor amarela das pascoinhas e a intensidade do seu aroma. Nada é regado e tudo se aguenta.

 

Árvores que abraçam o Recinto

Se nos parques de estacionamento o principal objetivo do arvoredo é fazer sombra, nas vias que ladeiam a Basílica da Santíssima Trindade e o Recinto de Oração o objetivo é constituir uma barreira acústica e visual. O silêncio de Fátima também se consegue à custa de duas alas densamente habitadas por espécies tão variadas como loureiros, freixos, pilriteiros, choupos, carvalhos, adernos, folhados e pinheiros mansos. Até um sabugueiro ali pode ser encontrado.

A descrição não ficaria completa sem uma referência aos cedros. São incontornáveis. Há décadas que abraçam o recinto. Do alto dos seus 18 metros têm sido espetadores privilegiados de todos os momentos marcantes: das multidões dos grandes eventos ao deserto ditado pela pandemia.

Também nestes espaços, José Sales conta que quase não há intervenção. No entanto, a monitorização é regular e, de dois em dois anos, são feitas análises biomecânicas às árvores. Um registógrafo verifica a densidade da madeira, um martelo de impulsos ausculta as vibrações e um inclinómetro analisa o pendor.

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A azinheira grande

Avaliação regular tem também a azinheira grande, ao lado da Capelinha das Aparições. “É o meu ‘ai-jesus’”, reconhece José Sales. Explica que à semelhança dos outros espaços, também aqui a intervenção é mínima para não ferir as raízes e reduzir o risco de a ver atacada por fungos. “É deixá-la o mais possível sossegada”, sustenta.

A azinheira, que tem mais de 100 anos e está classificada de “interesse público” desde 2007, foi a única que ficou do período das Aparições.

A árvore sobre a qual a Senhora do Rosário apareceu situava-se no local onde atualmente se encontra a peanha com a imagem, na Capelinha. A azinheira que chegou até aos dias de hoje é aquela em que Lúcia, Francisco e Jacinta viram, pela segunda vez, o relâmpago que antecedeu a aparição de 13 de maio. Foi sob esta árvore que, nos meses seguintes, rezaram o terço com as pessoas que os acompanhavam e aguardavam a visita da Senhora.

Com 11,5 metros de altura, um diâmetro de copa de 20,1 metros e 2,95 metros de perímetro de tronco, o “interesse público” foi atribuído à azinheira grande por “motivos históricos ou culturais”, ou seja, pela sua associação às Aparições. Uma parte considerável dos peregrinos veem-na como um ponto de visita incontornável, sendo objeto de muitas intenções e agradecimentos.

Para o Santuário, a azinheira grande e todos os espaços verdes que testemunharam a vivência dos Pastorinhos são objeto de um intenso cuidado. Preservar essa herança é manter viva a história que dá sentido ao lugar. É conservar um património de todos.

 

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