21 de abril, 2013
D. António Marto esteve em visita pastoral ao Santuário de Fátima entre 16 e 21 de abril de 2013.
Numa entrevista que foi acontecendo aos poucos, quase a par e passo com a visita de D. António Marto aos vários serviços e à sua participação em reuniões e encontros, a Sala de Imprensa do Santuário de Fátima conversou com o Bispo de Leiria-Fátima sobre esta iniciativa inédita da visita pastoral à instituição e sobre o presente e o futuro que se espera do Santuário e da Mensagem de Fátima.
D. António Marto apenas entendeu não responder a uma pergunta: "Algo o desgostou ou entristeceu nesta visita?". Ao explicar porque não respondia, D. António Marto respondeu: "Não vi aqui nada de que não gostasse, gostei de tudo, vivi uma experiência de fé e de graça, agradeço ao Senhor esta possibilidade". Entrevista conduzida por LeopolDina Simões 1- Porque pensou realizar esta visita pastoral ao Santuário de Fátima? Esta visita pastoral é como que o coroamento de todo o dinamismo que envolveu a visita às comunidades cristãs da diocese de Leiria-Fátima. A visita pastoral à diocese começou a 31 de janeiro de 2008, terminará na Cova da Iria, junto de Nossa Senhora de Fátima. Nesta vinda à casa da Mãe não venho fazer uma visita de médico, nem tão pouco de turista; venho como peregrino e como pastor de uma comunidade que tem muitos dons e de entre eles tem um dom muito especial: o santuário de Fátima, que é a jóia da coroa. 2- Quais são então os principais propósitos da visita? É a diferença entre ser-se peregrino e ser-se turista. O turista vem para conhecer, para visitar, o que tem todo o cabimento; mas não é o mesmo que ser-se peregrino. O peregrino vem para se confiar a Deus, tem como objetivo um lugar santo, onde pretende viver uma experiência pessoal de fé e de graça que lhe permitirá voltar à sua vida quotidiana com novo vigor e esperança. Pretendo com esta visita cumprir três propósitos. Primeiro, pretendo entregar no coração da nossa Mãe, Nossa Senhora de Fátima, todos os anseios da minha comunidade diocesana. Repare que não venho sozinho, trago comigo a minha diocese. Depois da visita pastoral às comunidades venho aqui trazer os rostos concretos da diocese de Leiria-Fátima: as crianças, os jovens, os idosos, os casais, os migrantes, os consagrados, os doentes, os presos… Não há nenhuma situação irreparável na vida das pessoas; tudo se pode resolver sempre, há que ter esperança. Trago também a Nossa Senhora um agradecimento por tudo o que de bom encontrei nesta visita pastoral, as pessoas, as comunidades e as várias instituições. Como terceiro objetivo, pretendo acercar-me de forma mais próxima da realidade do santuário: uma coisa é vir presidir ou participar em algumas celebrações ou em outras iniciativas, acompanhar a realidade do santuário através de reuniões ou pela leitura de atas que sempre me são enviadas, pelos relatórios; outra coisa é viver, é ver, o trabalho diário aqui realizado e partilhá-lo. 3- Como vive a Diocese de Leiria-Fátima a ligação ao Santuário de Fátima? Como disse, trago comigo a diocese de Leiria-Fátima. Em determinados momentos da visita pastoral senti-me pequenino, encontrei tantas vidas santas de homens, mulheres e crianças cheios de fé e de dedicação. Há muitos heróis, que desconhecemos, mas que são heróis do quotidiano. Venho aqui cantar o Magnificat pelos dons desta diocese. Venho como aquele que zela por esta comunidade particular. Assim como as pessoas têm um carisma, esta diocese também tem muitos: um deles, muito especial, é este santuário, que todos temos de cuidar, a começar pelo bispo. Em todas as comunidades da diocese há a devoção a Nossa Senhora de Fátima, que é a nossa padroeira assim como Santo Agostinho, e a devoção do terço. Anualmente, temos a peregrinação diocesana que faz com que a diocese se volte para o santuário. Este ano pareceu-me que houve menos participantes, sobretudo senti falta dos jovens. O projeto pastoral diocesano que saiu do sínodo terminou, mas já temos outro em marcha. Para 2013-2015 temos um tema muito importante: a família. Em 2016 e 2017, nos dois anos celebrativos do centenário das aparições de Fátima, dedicaremos um biénio a Nossa Senhora, Mãe da Igreja e Estrela da Esperança. O ano de 2018 será o Ano Jubilar do centenário da restauração da diocese. Penso que o biénio mariano talvez possa reforçar nos fiéis da diocese a ligação a Fátima, e despertar outros espiritualmente para o relevo da mensagem. É verdade que, por vezes, a força desta devoção a Nossa Senhora de Fátima se sente mais lá por fora do que na diocese, até por parte do presbitério. Temos de trabalhar para que esta perspectiva mude. 4 - Estamos na Semana Nacional das Vocações, o que fazer para colmatar a falta de sacerdotes na nossa diocese? Se falarmos em concreto no “caso” do Santuário de Fátima, também aqui é notória a falta de sacerdotes, mais visível talvez na área das confissões mas necessária em outros sectores... Sim, trago também aqui essa preocupação, trago uma diocese que precisa de um florescimento de vocações sacerdotais, repare que a maioria dos presbíteros tem mais de 70 anos, o que é uma preocupação, em certo momento vamos sentir a falta de padres, mas não vamos dramatizar, esperemos com fé a primavera espiritual. Não nos podemos desmotivar. A nossa sociedade sofre de glaucoma espiritual, somos propensos só a ver o que é negativo, eu não quero ser assim. 5- Como bispo de Leiria-Fátima, a sua ação alarga-se a um território vasto do qual o Santuário de Fátima é uma apenas parte, ainda que uma parte com um âmbito completamente diferente, até em termos de influência no mundo. Como consegue conciliar as várias dimensões? Nos primeiros encontros e audiências logo após a minha entrada na diocese recebi muitos recados, a começar pelos de alguns dos meus presbíteros: “Não se esqueça que a Diocese não é só o Santuário de Fátima!”. Percebi o toque. Realmente, com tantas celebrações e atividades que aqui acontecem diariamente, muitas das quais as pessoas nem se dão conta, como reuniões, congressos, retiros, promovidos pelos mais variados movimentos e instituições, se eu fosse a dizer sim a tudo, deixaria de poder acompanhar o resto da diocese que, mesmo sendo pequena, é muito diferenciada. 6- Pouco após ter tomado posse como bispo de Leiria-Fátima, numa vinda ao Santuário de Fátima, disse que Santuário era como que uma “cidade dentro da cidade”. Agora que teve oportunidade de conhecer “a cidade” por dentro e de acompanhar o dia a dia da instituição, mantém esta ideia? Mantenho. Não se faz ideia da multiplicidade de serviços que são necessários para o acolhimento que aqui é feito, em todas as vertentes. É preciso quem prepare, organize, investigue, estude e divulgue as celebrações e as outras iniciativas, quem acolha os peregrinos e visitantes, quem trate dos aspetos técnicos e de logística, quem zele pela limpeza dos espaços exteriores e interiores, quem cuide do ambiente de recolhimento e de oração. Quando tudo funciona, nem nos apercebemos que, para estar assim, alguém tem de zelar pelas coisas, nas grandes e nas pequenas situações. Nesta visita pude conhecer os que trabalham nos bastidores e os que trabalham no palco e ver que todos são necessários. O trabalho do Santuário é reconhecido por mim e, posso dizê-lo, também pela Conferência Episcopal Portuguesa, que aprecia o dinamismo e a dedicação. Nesta visita vi de forma mais aproximada a riqueza e a multiplicidade de sensibilidades que aqui habitam mas, é interessante, que todas convergem para a dimensão evangelizadora do santuário. Todos são dedicados a esta missão, todos sentem o santuário como algo que diz respeito às suas vidas e ao seu próprio coração. 7- O que o impressionou mais? Impressionou-me todo este dinamismo, toda esta organização, toda a dedicação, a competência e a seriedade com que se tratam os problemas e se procuram as soluções. Estive em várias reuniões, visitei todos os sectores, desde as oficinas, as lojas, a livraria, as casas de acolhimento, os espaços em Aljustrel, o Centro Pastoral de Paulo VI, o Centro de Ação Social, a Casa de S. Miguel, visitei os espaços de secretaria e outros, e vi que é muito diferente estar aqui a participar nas coisas, é mesmo encantador e merece uma palavra de regozijo e de felicitação. 8- Sentiu-se bem acolhido? Entrei aqui com a cabeça e com o coração e foi assim que fui recebido. Senti-me acolhido como um irmão entre os irmãos, quer dizer, recebi um acolhimento fraterno da parte do reitor e dos capelães e de todos os colaboradores do Santuário. Receberam-me com uma alegria que se tornava visível no rosto e, por isso, não me senti estranho, senti-me em casa, de casa. Espero ter trazido conforto espiritual a todos os colaboradores, eu vou reconfortado com toda a riqueza de vida e de trabalho que aqui se realiza. 9- Que mensagem quis deixar aos que cá trabalham e aos que voluntariamente aqui prestam serviço? Quis sobretudo trazer-vos uma palavra da luz do Evangelho, estamos no Ano da Fé e somos chamados a confirmar os irmãos na fé, quer os que aqui trabalham quer os peregrinos. Queria que compreendessem o vosso trabalho no Santuário de Fátima como um dom, uma missão, ainda que seja também um emprego. Sois chamados a colaborar nesta missão do santuário em ordem a cuidar, a velar, para que esta mensagem chegue aos peregrinos, para que os peregrinos aqui encontrem um momento de oásis, de repouso espiritual, onde se possam encontrar a si mesmos e levar a alegria e a esperança de serem cristãos para onde vivem, e aos com quem vivem, a começar pela família. Fátima tem de ter um clima de silêncio, de atenção e de cuidado, o santuário e a cidade são a montra da espiritualidade que as pessoas procuram. Gostaria que os funcionários tivessem orgulho, honra, em trabalhar aqui, e que os voluntários se sentissem realizados em colaborar com esta importante missão. Ao santuário peço que vos dê condições para que trabalhem com competência e com honestidade. Manifestei a estima pessoal a todos, o apreço pelo trabalho e a gratidão pela competência. Todos devem trabalhar com profissionalismo e responsabilidade, aos que têm trabalhos mais expostos disse que o acolhimento é muito importante, a atenção, a simpatia, a personalização, a humildade, o cuidado. Tive também oportunidade de referir que o testemunho de vida dos colaboradores é importante. A vida aqui tem um significado para os que aqui trabalham e para os que cá vêm. Há que ter um perfil de vida cristão, tem de haver coerência. 10- Qual o relevo do Santuário e da Mensagem de Fátima para a Igreja em Portugal e para o Mundo? Conheci a beleza e a riqueza da mensagem de Fátima nos 80 anos das aparições de Fátima, porque tive de preparar uma conferência sobre o tema da Eucaristia na Mensagem de Fátima para apresentar num congresso. Quando li as “Memórias da Irmã Lúcia” pela primeira vez — depois li-as logo se seguida outras duas vezes — vi que a mensagem era muito mais importante do que aquilo que eu pensava, pensava que era assim como que uma história para crianças. Falava da guerra, da perseguição feroz pelo mundo ateu, falava desta situação de dor e de miséria que fez com que a Mãe tivesse de regressar à Terra para, através de três crianças, nos reconduzir ao caminho de luz que é uma vida em Cristo. Não há mudança que não passe pela mudança dos corações. Quanto mais os homens se afastam de Deus, mais se afastam uns dos outros. Vê-se aqui a importância e a atualidade da mensagem de Fátima, uma mensagem profética e escatológica, perfeitamente atual. 11- Qual lhe parece a prioridade pastoral do Santuário de Fátima? A aposta na pastoral da Evangelização em que o santuário seja como um oásis espiritual em que os peregrinos podem fazer a experiência da beleza de Deus e do seu amor que salva; a experiência da ternura maternal de Maria que nos dá olhar e coração para contemplarmos a ternura e a misericórdia de Deus; a experiência da caridade e de serviço aos irmãos, como aqui afirmou Bento XVI. Nesta linha, gostaria de ver reforçada uma ligação maior do santuário com os jovens e com a pastoral juvenil. 12- O que poderão trazer de novo para a mensagem de Fátima as celebrações dos cem anos das aparições? Tudo converge para o Centenário, como celebração histórica e como profecia para o nosso tempo. Há que aproveitar este momento para aprofundar a atualidade, a beleza e a riqueza da mensagem para o nosso tempo e apostar na dimensão mundial do santuário, abrindo e reforçando os laços com a Igreja universal, sobretudo com os países emergentes como o Brasil. |