12 de outubro, 2007

RESULTADOS E PROPOSTAS DO CONGRESSO:
MEMÓRIA PARA O FUTURO

Depois destes dias de reflexão, foi possível reter algumas sugestões e linhas de orientação que poderão ajudar a conhecer melhor e a tornar mais conhecida a mensagem de Fátima, dela extraindo cada vez mais riquezas. Algumas missões poderão então ser aqui evocadas e deixadas para o próprio santuário.
Ficou patente a necessidade de conhecer melhor as causas da secularização e o contributo da mensagem de Fátima para ajudar a superar este processo. No que ao contexto histórico do evento diz respeito, será útil perceber o reticulado das relações entre as autoridades dos poderes locais e regionais ao tempo das aparições para melhor compreender os interesses que estavam por trás da recepção das próprias aparições, o mesmo é dizer, é necessário reconhecer as motivações que levaram e como levaram as autoridades dos poderes local e nacional a tentar funcionalizar Fátima.
Continua ainda por explorar a afinidade linguística e simbólica entre a mensagem de Fátima e a apocalíptica. Esta tarefa apenas foi aqui enunciada. A riqueza da simbologia da mensagem configura um cariz eminentemente apocalíptico, o mesmo é dizer, desvelatório. Será necessário explorar o horizonte apocalíptico em que o evento das aparições se dá, o género literário do apocalipse usado pela Irmã Lúcia bem como a fé de tonalidade apocalíptica que nos é oferecida na mensagem de Fátima.
Ficou claro que a mensagem de Fátima com o seu alcance universal possibilita também uma fraternização da piedade popular, o que terá de ser reproposto como vivência da fé e como possibilidade de vivência dessa mesma fé. Daqui resulta uma outra exigência, a da própria evangelização da piedade popular como espaço democrático de experiência da comunhão eclesial. Para esta tarefa foi também pedida a urgente preparação de um manual de devoções
Foi solicitado apresentar a mensagem de Fátima como proposta que é de um desafio cordial da esperança. A terceira parte do segredo não é só a visão do inferno, mas o anúncio positivo da verdade e da seriedade do amor, palavra tão actual culturalmente.
Estando no coração da mensagem a adoração à Santíssima Trindade, é lógico que a pastoral do santuário não se esqueça de ajudar e de fomentar o diálogo ecuménico e inter-religioso, enquanto espaço e mensagem abertos ao mundo.
É igualmente claro que é necessário dar a conhecer a santidade das crianças: elas são infantis por terem pouca idade, mas conseguem e sabem ser responsáveis, logo são adultas na fé. É preciso anunciar isto, dizer que isto é possível como no caso das duas primeiras crianças não mártires em toda a história da Igreja. Isto poderá ser já uma mensagem de esperança, na medida em que apresenta a santidade ao alcance de todos e não apenas de alguns eleitos ou privilegiados. Apresentar os Pastorinhos como modelo de santidade acessível a todos será seguramente uma boa notícia, evangelho. Dar a conhecer mais a biografia dos santos provavelmente alargará este anúncio e será pedagogicamente um veículo, para anunciar Jesus Cristo.
Sendo assim, poder-se-á anunciar a possibilidade da doação do sofrimento na catequese e na nova evangelização. Fazer chegar aos secretariados da catequese isso mesmo poderá ser um contributo valioso.
A actualidade da mensagem dos Pastorinhos ganha uma pertinência cultural muito grande com tudo isto: repropor uma nova concepção de relação filial, como correcção crítica ao moderno princípio da autonomia. A visão do homem em Fátima não se baseia no princípio moderno da autonomia e da auto-suficiência. Dizer isto ao nosso tempo é extremamente difícil, ainda que imprescindível.
Foi notória e seriamente advertido como é a teologia da cruz que consegue precisamente evitar que se transforme o cristianismo numa ideologia. Esta é a consequência de um cristianismo sem cruz, ou melhor dito, de um cristianismo que pense ou proponha a existência cristã sem cruz. Isto tem evidentes consequências para o discurso teológico e para a própria prática da nova evangelização, pois obriga a não escamotear o evangelho.
Provavelmente, a teologia da libertação terá novamente de ser recolocada como horizonte hermenêutico do discurso teológico contemporâneo, no qual a linguagem da própria mensagem de Fátima poderá adquirir um lugar de relevo enquanto proposta libertadora da condição ilusória ou alienante quer de um futuro sem Deus quer de uma existência cristã que negue a sua condição mortal e a necessidade de a própria liberdade ser liberta, ser redimida. O apelo à fé com todo o radicalismo face à indiferença religiosa ou às violações da liberdade religiosa não pode nunca ser abandonado. Pede-se ao santuário a coragem para nunca deixar de anunciar a verdade do evangelho na sua inteireza, na sua verdade.
A mensagem de Fátima então ajuda o próprio discurso teológico e a Igreja a corrigir a sua derrapagem ideológica que enfatiza em demasia a glória ou a ressurreição, prescindindo da cruz. Do ponto de vista da cristologia, voltam a ganhar actualidade quer as figuras bíblicas do servo, do Cristo sofredor e do Cristo crucificado de S. Paulo, escândalo para os gentios e loucura para os judeus (cf. 1 Cor 1,23). A Igreja não pode deixar de anunciar como S. Paulo o Cristo crucificado, gostem ou não do Cristo cercado de espinhos, gostem ou não do Cristo cujo coração é dilacerado. Essa é a nossa verdade e a verdade do amor de Deus. Provavelmente, o discurso teológico terá (pelo menos) de voltar a confrontar a mensagem de Fátima com a teologia da cruz, e com uma nova teologia da libertação, o que tem repercussões ao nível da teologia trinitária e depois ao nível da teologia social e política, no sentido da construção pública da cidade. Reler os beatos Jacinto e Francisco à luz de S. Paulo no novo ano Paulino de 2008 certamente terá aqui lugar.
Na busca de um enquadramento teológico a partir da espiritualidade de Fátima (mas não só da espiritualidade, igualmente do vocabulário da reparação e de alguns conceitos da sua mensagem), foi mostrado como a dureza de algumas práticas ou simbologias em Fátima (quer na mensagem quer na espiritualidade) estão perfeitamente em sintonia com as exigências evangélicas de entrar pela porta estreita (cf. Mt 7,13-14), o que conota a mensagem de Fátima de um evidente alcance moral e ético. Esta dimensão provoca à insistência no convite à oração e à penitência, o mesmo é dizer, ao anúncio constante à conversão, gostem ou não gostem, exista ou não exista audiência, oportuna e inoportunamente. É necessário manter um forte apelo à conversão pelo anúncio da penitência dos pecados através de uma sempre renovada pastoral do sacramento da penitência.
Este apelo tem evidentes consequências espirituais e teológicas, pois constitui ele mesmo uma crítica ao deísmo da espiritualidade moderna de um Deus que parece não Se deixar tocar ou influenciar por nós. Antes, em Fátima Deus como que também aprende e nós como que O podemos ensinar, porque Ele nos deixa tal tarefa respeitando a nossa liberdade e dando-nos o espaço do pleno exercício consciente e livre da mesma.
Continua actual o anúncio do segredo do Deus das misericórdias mas também como o Deus do julgamento em que a liberdade humana é respeitada até ao fim, sendo assim afirmada como espaço absolutamente humano do exercício da responsabilidade dos nossos actos, os quais adquirem alcance eterno contra todo e qualquer determinismo antigo ou moderno.
Foi proposto o anúncio sem medo da temática da reparação como oportunidade de consolação de Deus.
Pastoralmente, o santuário continua com a tarefa da educação para a mais genuína devoção mariana e com a missão da proclamação da dimensão pública da fé enquanto projecto social e político, isto é, com implicações na mundividência e na organização da cidade dos homens na qual está presente e a cidade de Deus.
P. José Jacinto de Farias, scj
Presidente da Comissão Científica do Congresso Fátima para o Século XXI
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Rosário, na Capelinha das Aparições, e procissão das velas, no Recinto de Oração

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