05 de novembro, 2022

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“A peregrinação passou pelos caminhos dos calvários e pelos caminhos das esperanças destes povos”, diz D. José Avelino Bettencourt

Termina este domingo, dia 5 de novembro, a primeira visita da Imagem da Virgem peregrina de Fátima ao Cáucaso. Esteve agendada duas vezes, mas a pandemia adiou-a.

 

Que significado tem esta viagem da Virgem Peregrina de Fátima ao Cáucaso?

A vinda da Imagem Peregrina de Nossa Senhora de Fátima ao Cáucaso já se perspetivava há quatro anos. É a primeira vez na História que a imagem vem para esta região. Trata-se de um território de múltiplos conflitos históricos, entre impérios, etnias e mesmo entre religiões. Por exemplo, a cidade de Tbilisi foi destruída e reconstruída trinta e oito vezes na sua história.  Entre 1915-1917 sucedeu o genocídio de 1,5 milhões de arménios.

Em 1917 dão-se as aparições de Fátima...

Fátima é uma devoção mariana cristã de grande relevo mundial e, em particular, para as repúblicas da antiga União Soviética, a que os países do Cáucaso pertenceram. A Igreja católica foi muito perseguida na União Soviética. Por exemplo, na Geórgia apenas um templo católico, a igreja de São Pedro e São Paolo em Tbilisi, continuou aberto aos fiéis para o culto, mas com muitas restrições. O próprio pároco passava as noites na igreja para assegurar que as autoridades políticas não tomavam posse da igreja. Muitos fiéis foram deportados, por castigo, para a Sibéria. A maior ironia é que hoje são estes países que acolhem os refugiados da região.

Também é um sinal da Mensagem: a perseverança e o poder da oração...

Nas aldeias remotas a fé católica sobreviveu “com rosários nas mãos dos fiéis”.  A mensagem de Fátima é uma mensagem de reconciliação e de paz. Nesta região vivemos constantemente com o risco de guerras e, por isso, a visita da imagem de Fátima, a Rainha da Paz, tem um profundo significado.

Como foi pensada esta peregrinação tão desejada?

Anteriormente à minha partida de Roma para o Cáucaso, o Senhor Cardeal D. António Marto convidou-me a visitar Fátima antes de assumir as funções como Núncio Apostólico. Tive ocasião de celebrar a Santa Missa no Santuário de Fátima, no mês de maio 2018, como neo-Núncio e de pedir a intercessão de Nossa Senhora para a missão confiada pelo Papa Francisco e por todos os povos da região. Depois de chegar ao Cáucaso, a proposta de uma visita da imagem de Nossa Senhora de Fátima foi muito bem acolhida pelos três bispos da região.

Mas a pandemia adiou sucessivamente essa vontade...

Infelizmente, dada a pandemia sanitária mundial da COVID-19, e por questões logísticas locais, a visita foi adiada mais de uma vez. E por fim, quando a imagem devia ter chegado, retardou ainda quatro dias.

No Cáucaso a imagem passou pelas cidades e aldeias mais remotas onde se encontram católicos e gente de boa vontade. Tudo é providência e a imagem foi acolhida com muita fé da parte dos católicos e de todas as pessoas de boa vontade.

Desde que começou o seu périplo a Imagem da Virgem Peregrina tem sido uma embaixadora da paz percorrendo os cinco continentes e tocando diferentes países. Será a primeira vez que estará nesta região tão significativa e, ao mesmo tempo, tão castigada por querelas políticas, mas também religiosas. De que forma a mensagem de Fátima, que esta imagem representa, pode ser uma chave de leitura para o tempo atual?

No centro da mensagem de Fátima está o convite à reconciliação e à paz. É uma mensagem que toca as raízes cristãs e os corações de todos homens de boa vontade.  É uma mensagem para todos os tempos, e a imagem de Nossa Senhora de Fátima é um convite à oração. A presença da imagem é importante e também simboliza a participação de toda a Igreja junto deste pequeno e martirizado rebanho de fiéis.

Vivemos tempos desafiadores na Igreja, e o Santo Padre, sobretudo na Encíclica Fratelli Tutti, deixa claro que não haverá paz sem diálogo religioso, seja numa perspetiva ecuménica seja numa perspetiva inter-religiosa. Atualmente, desempenha funções num lugar onde várias destas questões se colocam. Como vê a questão e como é que a Igreja Católica deve corresponder, nas diferentes Igrejas locais, a este desafio?

O diálogo religioso é a única via que temos para nos entendermos e, de um modo especial, para nos compreendermos como cristãos. Porém, o diálogo religioso não é uma coisa fácil, dado que existem tantos preconceitos, ingerências e manipulações políticas que fomentam e usam o desentendimento como arma de guerra para fins políticos e mesmo para fins lucrativos nefastos. Nesta região do Cáucaso existe incentivo ao espírito de “encontro” a todos os níveis possíveis. Em particular, tivemos a alegria de, no passado dia 26 de junho, o Coral Patriarcal Georgiano Ortodoxo da Catedral da Santíssima Trindade de Tbilisi ter dado um concerto de polifonia tradicional georgiana na Capela Sistina, no Vaticano, com a participação dos cantores da Capela Sistina. Juntos, os corais, cantaram um hino a Nossa Senhora composto pelo Patriarca Ortodoxo Georgiano Élia II. Os corais também cantaram na Basílica de São Pedro por ocasião da Solenidade de São Pedro, Apóstolo, no passado dia 29 de junho. Foi um acontecimento único e histórico, retransmitido muitíssimas vezes pelos canais televisivos nacionais georgianos durante as seguintes semanas.

Mas a relação entre católicos e ortodoxos nesse lugar não é simples...

Num contexto ortodoxo religioso como este, onde os católicos são vistos como hereges, o batismo católico não é reconhecido e nunca somos convidados a estar presentes num ato religioso ortodoxo e, por isso, a realização do concerto no Vaticano foi um evento realmente extraordinário. As imagens tiveram um impacto muito positivo na Geórgia, dando relevo ao espírito de “encontro” e possivelmente também de “diálogo” entre povos.

Fátima é o altar do mundo, mas também acolhe o mundo inteiro. Neste círculo virtuoso há um objetivo que convoca toda a Igreja: o da evangelização. De que forma, através de uma imagem, podemos concorrer para este objetivo sem cedermos à tentação da idolatria, como o Santo Padre tem alertado?

No Cáucaso vivemos em proximidade com o mundo bizantino, ortodoxo e ritualista, onde as formas e os ícones religiosos são considerados essenciais ao culto, com a liturgia e mesmo com a maneira de ser. Os ortodoxos que eu encontro nesta região olham, muitas vezes, para nós católicos como uma instituição puramente “social e cultural despojada de qualquer sentido religioso”. É óbvio que são pontos de vista extremos.

Creio que os georgianos ortodoxos, também nossos irmãos na fé cristã, têm algo a ensinar aos cristãos do ocidente. O Ocidente e o Oriente são os dois pulmões da Igreja, como nos dizia São João Paulo II.  A imagem de Nossa Senhora de Fátima foi visitada por muitos católicos, ortodoxos, arménios apostólicos e muçulmanos também. Em muitas ocasiões durante a visita, a imagem de Nossa Senhora de Fátima foi um motivo de encontro e de aproximação num espírito de serenidade e de paz.

Como gostaria de fazer o epílogo desta viagem?

No mês de março de 2022, o Papa Francisco consagrou a Ucrânia e a Rússia ao Imaculado Coração de Maria rezando pela paz no mundo. Em plena guerra na Ucrânia, país vizinho, a imagem de Nossa Senhora de Fátima veio pela primeira vez aos países do Cáucaso, Geórgia, Arménia e Azerbaijão no mês de outubro 2022. Estes países do Cáucaso vivem os seus próprios conflitos, pouco conhecidos no ocidente e, por vezes, mesmo agravados por posições tomadas a nível internacional.

Esta peregrinação tomou como “palco” esta realidade, uniu católicos e não católicos em espírito de oração pela paz e reconciliação. A peregrinação passou pelos caminhos dos calvários e pelos caminhos das esperanças destes povos. Continuam a chegar até nós muitas expressões de gratidão e de imenso apreço por esta peregrinação. A força da oração e as graças derramadas por intercessão de Nossa Senhora de Fátima ainda hoje são sentidas. Por isso, fica um agradecimento muito grande ao Santuário de Fátima.

*D. José Avelino Bettencourt é Núncio Apostólico da Santa Sé na Geórgia e na Arménia. Foi o pormotor desta peregrinação.

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